Ressurreição de Cristo

A RESSURREIÇÃO DE CRISTO E A NOSSA RESSURREIÇÃO

Jesus viveu a vida humana, especialmente as suas limitações, não escapando à própria morte. Mas os textos inculcam com igual vigor que Jesus também ressuscitou, isto é, voltou à vida, à plenitude da vida na qual o Pai o reintegrou. Sem esta conclusão, o itinerário de Jesus teria sido, em grande parte, um fracasso. Ficaria na história como qualquer outro grande homem, exemplar pela coerência transparente da vida, mas não salvador de todos os homens.

O mistério pascal com o seu duplo pólo – morte e ressurreição – diz aos homens que, apesar da morte, eles estão chamados por Deus à vida e para a vida. O realismo impõe-nos como inelutável a nossa condição mortal. Mas a fé diz-nos que um homem, Jesus Cristo, goza da plenitude da vida como primícias dos ressuscitados. Isto quer dizer que a sorte que já é realidade em Jesus cabe-nos igualmente a nós, porque titulares da mesma esperança, por dom misericordioso daquele que é a fonte da vida.

Importante para Jesus, a sua Ressurreição é garantia da vitória alcançada sobre a morte, vitória que nós partilharemos, se vivermos e morrermos com Ele.

Preocupação da morte ou ocupação da vida? A igreja apostólica soube captar o que isto encerrava de boa-nova libertadora para todos quantos experimentam a opressão da morte. Jesus libertou-nos da morte, não escapando a ela ou rejeitando a condição mortal, mas atestando pela sua nova situação de ressuscitado que, para além da morte, há vida, existe a vida.

Não admira que esta percepção estivesse na base da ação dos apóstolos que não se cansaram de testemunhar a Ressurreição de Jesus como Pedra angular, capaz de ir ao encontro das humanas ânsias de viver, rica para as ultrapassar, dando-lhes uma inesperada e radiosa saída. Daí o entusiasmo de Pedro em casa de Cornélio; daí a euforia de Paulo ao propor as suas convicções à comunidade de Corinto, onde as certezas filosóficas de colorido grego dificultavam o acolhimento da ressurreição dos corpos (cf. 1Cor 15).

Não é sem razão que o teor da pregação apostólica, embora preocupada com a morte, se apresentou predominantemente como ocupação da vida. E, por este viés, conseguiu simpatias e adesões.

A certeza cristã numa felicidade além túmulo foi, por vezes, invocada como tranqüilizante e adormecedor face às urgências da vida presente. É uma errada utilização da esperança. Essa fé numa vida que está por vir, em vez de calmar, devia precipitar-nos para as transformações que se impõem para que a nossa existência humana se pudesse chamar cada vez mais vida. De resto, nunca se viu uma meta final que não fosse precedida por outras intermédias que para lá encaminham. O nosso empenho devia ser total.

E a diferença da fé cristã está nisto: enquanto homens ateus, com o risco da própria vida, aceitam tarefas unicamente motivados pela melhoria de vida que preparam para os outros, ficando eles sepultados nos alicerces do mundo novo futuro, a nossa certeza cristã na ressurreição garante-nos que “o nosso esforço não é inútil no Senhor” (1Cor 15,58); nós, mesmo morrendo antes da vitória final, não ficaremos sepultados para sempre, antes pelo contrário, também nos sentaremos ao banquete da vida em cuja preparação colaboramos.

Cume da vida de Jesus, realidade central da proclamação apostólica, meta final do mundo dos homens, a ressurreição é caminho longo a percorrer por cada um. Por isso se traduz em exortação para todos os dias do cristão.

Paulo não se cansa em recorrer a tal incentivo. O apóstolo nos adverte de que os ressuscitados em Cristo, pelo acesso a esta nova inspiração de vida, devem procurar as coisas do alto, onde Cristo está. Não se trata de desprezar as coisas da criação, mas de as pôr no seu lugar, em usá-las porque tal idolatria atenta contra a primazia de Jesus, o único chefe.

Noutros termos, importa viver com os homens do mundo sem se confinar aos seus critérios e escalas de valores, viver já agora com o segredo que animou a vida de Jesus para que a transformação prossiga até que um dia se manifeste um mundo em moldes dignos de Jesus ressuscitado.