A Semana Santa

A Semana Santa é santa porque nela celebramos os momentos mais importantes da nossa salvação.

EXPLANAÇÃO DE SEU SIGNIFICADO E LITURGIA

São João resume desta forma: “Com efeito, de tal modo Deus amou o mundo, que lhe deu seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna.

Pois Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condená-lo, mas para que o mundo seja salvo por ele” (Jo 3,16-17).

E também: “Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a sua hora de passar deste mundo ao Pai, como amasse os seus que estavam no mundo, até o extremo os amou” (Jo 13,1).

Com sua entrega por nós, Jesus santificou essa semana, e nós a santificamos com nosso compromisso cristão.

Ao abraçar em seu coração humano o amor do Pai pelos homens, Jesus “amou-os até o fim” (Jo 13,1) “pois ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos que ama” (Jo 15,13).

Assim, no sofrimento e na morte, sua humanidade se tornou o instrumento livre e perfeito de seu amor divino, que quer a salvação dos homens. Com efeito, aceitou livremente sua paixão e sua morte por amor de seu Pai e dos homens, que o Pai quis salvar: “ninguém me tira a vida, mas eu a dou livremente” (Jo 10,18).

Daí a liberdade soberana do Filho de Deus quando ele mesmo vai ao encontro da morte.

Os dias da semana santa oferecem uma oportunidade muito privilegiada para renovarmos nosso encontro pessoal e comunitário com a Pessoa de Jesus Cristo e experimentarmos a força e o ardor com que nos ama, a ponto de dar sua vida por nós na cruz.

Deverá ser uma semana de intensa evangelização. A morte e a ressurreição de Jesus estão no centro do querigma cristão, no centro do primeiro anúncio, que a igreja retomou vigorosamente na nova evangelização.

Na oração, na meditação, na leitura orante do evangelho e na participação das cerimônias da semana santa, teremos oportunidade de encontrar-nos com Cristo vivo, fortalecer nossa adesão a ele e encher-nos do fogo do Espírito Santo para irmos em missão evangelizadora.

Celebrar a Semana Santa para os cristãos, é aprofundar as dimensões mais importantes da vida humana. É a ocasião privilegiada oferecida pela LITURGIA para a renovação de um COMPROMISSO com a vida, e com a fonte da vida, a única que tem força para superar a morte e os esmagamentos que pesa sobre o povo.

A Semana Santa comemora a Paixão de Cristo, sua morte e ressurreição. O centro da Paixão de Cristo é a CRUZ, símbolo da fé e da redenção. 

Em que consiste a espiritualidade da Semana Santa?

Na sociedade atual a Semana Santa vem perdendo o clima religioso popular. Porém, sobrevivem manifestações de devoção centralizada na Paixão de Cristo.

O povo venera Cristo como o “homem das dores”, o nazareno sofredor e moribundo, com ele vive a sua agonia enquanto povo de oprimidos e deserdados. Por esta razão que é a Sexta feira Santa, não o Domingo da ressurreição, a festa cristã popular de maior importância na Semana Santa, para aqueles que não vivem plenamente o evangelho. Para estes a morte de Cristo é símbolo de todo o sofrimento.

A identificação com o Crucificado leva o povo a plasmar em imagens, gestos, cantos e orações a sua espiritualidade pascal.

O símbolo popular mais forte e comovedor da Semana Santa é a CRUZ. Eis a mística da CRUZ: “Em tudo somos oprimidos, mas não sucumbimos. Vivemos em completa penúria, mas não desesperamos. Somos perseguidos, mas não ficamos desamparados”. (2Cor 4,8-9)

Para entendermos a espiritualidade da Semana Santa, centrada na Paixão de Jesus, convêm fixarmos nos 3 pontos principais:

  1. Sacramental: que corresponde a celebração do Tríduo Pascal, segundo os livros litúrgicos, vivido pelas comunidades e paróquias;
  2. Sinais: são as representações dos acontecimentos históricos, como a procissão de ramos e Domingo da paixão do Senhor; o lava-pés da Quinta feira santa; a adoração da cruz, da Sexta-feira santa; o lucernário pascal, da Vigília do sábado e na madrugada do Domingo da ressurreição com a procissão.
  3. Religiosidade popular: constituído por diversos atos piedosos e devocionais populares, baseados uns na agonia de Jesus, como a hora santa e o sermão das sete palavras; outros descrevem a paixão inteira do Senhor, como a via sacra, as representações teatrais e as procissões de semana santa.

Essas devoções ajudam a professar a fé, a descobrir o sentido do pecado, a familiarizar-se com a cruz de Cristo, a encarar-se com as injustiças deste mundo.

Tudo converge para o exemplo de Cristo e sua entrega como dom salvador. “Em Cristo, morto e ressuscitado, temos a esperança de que cada um de nós, de que nosso povo, esmagado por grandes sofrimentos, alcançaremos a libertação total”.

SEMANA SANTA – MEMÓRIA DE JESUS NO HOJE DA HISTÓRIA.

  • Para muitos a Semana Santa se iguala a um “retiro”. Param e querem pensar.
  • Neste período muitos fortalecem a fé, o amor e a esperança. Pensa-se em Deus. Para outros é a oportunidade de responder:
  • Qual o sentido da vida?
  • Como explicar tanto sofrimento?
  • Onde buscar esperanças?

No período da Semana Santa, refletindo sobre a Paixão de Cristo, fazemos nascer, cada dia, em nossos corações a luz e uma nova esperança que na grande vigília pascal brilhará para todo o mundo.

A Semana Santa celebra-se na comunidade. A Semana Santa para os cristãos se reveste de um sentido todo especial e é um marco importante no seguimento de Jesus Cristo.

Neste tempo, muitos procuram sair das cidades e abandonar as suas comunidades para fazer alguns dias de descanso na praia ou no campo.

Essa é uma prática imprópria e que em nada condiz com o sentido espiritual da pastoral e da liturgia que se celebra. Isso acarreta uma perda para a formação cristã e priva as pessoas da oportunidade de crescerem espiritualmente e se integrarem mais profundamente na vivência do Mistério Pascal de Cristo.

O lugar para passar a Semana Santa é a comunidade, participando de suas celebrações.

  • Tempo de Retiro. A Semana Santa é tempo privilegiado para a comunidade e os cristãos, no silêncio e na oração, fazerem o encontro com o Senhor, conviverem mais intensamente com Ele, avaliarem as suas práticas em busca da vida plena. É um tempo propício para acolher a misericórdia de Deus Pai, revelada na vida de Jesus, o Filho amado. Tempo para ler e escutar a Palavra de Deus e colocar a vida em dia diante do Senhor e dos irmãos. Tempo de ação de graças para bendizer o Senhor pela salvação que nos oferece.
  • Tempo de Renovação. Nos dias da Semana Santa a graça e a bênção de Deus são mais palpáveis e mais intensamente sentidas na comunidade. A força pascal do Cristo invade o tempo, atinge o coração, ilumina as mentes, questiona as contradições humanas e provoca o novo. Transforma o ser humano e o introduz numa nova vida, despertando o gosto pelas coisas de Deus, alimentando o prazer de estar com Deus, a serviço do seu Reino. Participar das celebrações na Semana Santa significa entrar na força da Páscoa do Cristo que tudo renova e plenifica com seu Espírito.
  • Tempo de cultivar o novo. Durante oito dias, celebrando o mistério da morte e ressurreição do Senhor, aprendemos em que consiste a liturgia do Filho de Deus que disse: “o Filho do Homem veio, não para ser servido, mas para servir…” (Mt 20,28) e que afirmou: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida por seus amigos”. (Jo 15,13). Esse jeito de Jesus entender a vida como serviço, nós lembramos e celebramos na liturgia. E pela liturgia, o Espírito Santo imprime em nossas vidas esse jeito de Deus amar e servir. Fazer memória de Jesus na liturgia nada mais é do que permitir que a novidade do evangelho, essa liturgia de Jesus, a sua solidariedade humano-divina se instaurem em nossas vidas e nos façam pessoas novas e santas, provocadoras do Projeto e vida em abundância para todos (Jo 10,10). Nas celebrações da Semana Santa se descobre e se cultiva a novidade do Reino de Deus. 

DOMINGO DE RAMOS E DA PAIXÃO DO SENHOR: LEMBRA O PROJETO DE JESUS.

Na liturgia deste domingo, revivemos a entrada de Jesus na cidade de Jerusalém para celebrar a sua Páscoa.

Unidos aos seus sentimentos, mergulhamos no seu projeto de obediência ao Pai e de serviço à humanidade. Lembrando Jesus reafirmamos nossa obediência e assumimos a solidariedade com os excluídos e marginalizados.

Três símbolos estão presentes na liturgia: os ramos, a procissão com ramos e a proclamação do Evangelho da Paixão.

Fazemos parte de um povo que sai às ruas, agitando ramos, cantando hinos ao Cristo, nosso Rei e Redentor. Aclamamos Jesus como Messias, o esperado das nações. Cremos que Ele vem realizar as promessas antigas e instaurar o Reino: Justiça para os pobres, participação na construção da sociedade solidária, convivência fraterna, paz entre os povos; diálogo entre as religiões e culturas e vida em abundância para todos.

Em cada celebração, o Senhor está presente para realizar as promessas e nós o acolhemos através da prece e da participação e nos unimos à sua missão de trazer a paz.

No Domingo de Ramos isso acontece de modo especial. A liturgia dos ramos não é uma repetição apenas da cena evangélica, mas sacramento da nossa fé na vitória do Cristo na história, marcada por tantos conflitos e desigualdades.

É o Domingo da Paixão de Jesus, do seu sofrimento assumido como expressão de compaixão pela multidão de famintos e da nossa compaixão com todos os sofridos em sua busca de libertação.

A entrada triunfal em Jerusalém é o convite para que os cristãos entrem hoje nas cidades e proclamem o Projeto de vida. Em procissão, aclamando que Ele vem em nome de Deus, aderimos ao seu projeto e abraçamos a sua atitude de servidor fiel até a extrema entrega na cruz.

No Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor, a igreja entra no mistério do seu Senhor crucificado, sepultado e ressuscitado, o qual, ao entrar em Jerusalém, preanunciou a sua majestade.

Os cristãos levam ramos e sinal do régio triunfo, que, sucumbindo na cruz, Cristo alcançou. De acordo com a palavra do Apóstolo: “Se com Ele padecemos, com Ele também seremos glorificado” (Rm 8,17), deve-se na celebração e catequese deste dia, salientar o duplo aspecto do mistério pascal.

A Celebração

Paramentos vermelhos
Canto inicial.
Saudação: Em nome…
Em seguida, por breve exortação os fiéis são convidados a participar ativa e conscientemente da celebração deste dia. Meus irmãos…
Bênção dos Ramos
Proclamação do Evangelho
Breve homilia
Procissão: Turiferário – cruz processional ornada – dois acólitos com velas – sacerdote com seus ministros – povo.
Ministros beijam o altar.
Omitindo os ritos iniciais reza-se a oração do dia.
Leituras
Evangelho (sem velas, sem incenso, sem saudação, sem o sinal da cruz sobre o texto).
Homilia… 
“O povo hebreu, levando ramos de oliveira, / foram ao encontro do Senhor”.

Canta assim a antífona litúrgica, que acompanha a solene procissão com os ramos de oliveira e de palmeira neste Domingo, chamado precisamente dos Ramos e da Paixão do Senhor. Revivemos o que aconteceu naquele dia: eram muitas as pessoas que exultavam à volta de Jesus, que montado num jumento entrava em Jerusalém. Alguns fariseus gostariam que Jesus os fizesse calar, mas Ele respondeu-lhes que se eles se calassem, gritariam as pedras (Lc 19,39-40).

A Cruz está no centro da liturgia de hoje. Não temeis a Cruz de Cristo. Ao contrário, sentis por ela amor e veneração, porque é o sinal do Redentor morto e ressuscitado por nós. Quem crê em Jesus crucificado e ressuscitado leva a Cruz como um triunfo, como prova evidente de que Deus é amor.

Com a doação total de si, precisamente com a Cruz, o nosso Salvador venceu definitivamente o pecado e a morte. Por isso aclamamos com júbilo; “Glória e louvor a ti, ó Cristo, que com a tua Cruz redimiste o mundo!”.

“Por nós, Cristo fez-Se obediente até à morte, / e morte de cruz. / Por isso Deus o exaltou / e lhe deu o nome que está acima de qualquer outro” (Fl 2, 8-9). Com estas palavras do apóstolo Paulo, elevamos a nossa aclamação antes do início da Semana Santa. Elas exprimem a nossa fé: a fé da Igreja.

Mas a fé em Cristo não é previsível. A leitura da sua Paixão põe-nos diante de Cristo, vivo na Igreja. O mistério pascal, que reviveremos nos dias da Semana Santa, é sempre atual. Nós somos hoje os contemporâneos do Senhor e, como o povo de Jerusalém, como os discípulos e as mulheres, somos chamados a decidir se estar com Ele, se fugir ou permanecer simples espectadores da sua morte.

Deparamos todos os anos, na Semana Santa, com o grande cenário no qual se decide o drama definitivo não só para uma geração, mas para toda a humanidade e para cada pessoa individualmente.

A narração da Paixão põe em relevo a fidelidade de Cristo, em contraste com a infidelidade humana. No momento da prova, enquanto todos, também os discípulos e até Pedro, abandonam Jesus (Mt 26,56), Ele permanece fiel, disposto a derramar o sangue para cumprir plenamente a missão que o Pai lhe confiou. Permanece Maria ao seu lado, silenciosa e sofredora.

Aprendamos de Jesus e da sua e nossa Mãe. A verdadeira força do homem vê-se na fidelidade com que ele é capaz de dar testemunho da verdade, resistindo a lisonjas e ameaças, a incompreensões e chantagens, e até à perseguição dura e desumana. Eis o caminho pelo qual o nosso Redentor nos chama a segui-Lo.

Só se estivermos dispostos a fazer isto, nos tornamos o que Jesus espera de nós, isto é, “sal da terra” e “luz do mundo” (Mt 5,13-14). A imagem do sal “recorda-nos que, mediante o batismo, toda a nossa existência foi profundamente transformada, porque foi “temperada” com a vida nova que vem de Cristo (Rm 6,4).

Não percamos o nosso sabor de cristãos, o sabor do Evangelho! Mantende-o vivo, meditando constantemente o mistério pascal: a Cruz seja a nossa escola de sabedoria. Não nos orgulhemos de mais nada, a não ser desta sublime cátedra de verdade e de amor.

A liturgia convida-nos a subir até Jerusalém com Jesus aclamado pelo povo hebreu. Daqui a pouco Ele “deverá sofrer e ressuscitar dos mortos no terceiro dia” (Lc 24,46). São Paulo recordou-nos que Jesus “se despojou a si mesmo, assumindo a condição de servo” (Fl 2,7) para nos obter a graça da filiação divina. É daqui que brota a verdadeira fonte da paz e da alegria para cada um de nós! Encontra-se aqui o segredo da alegria pascal, que nasce do sofrimento da Paixão.

Façamos votos para que cada um de nós, queridos amigos, participemos desta alegria. Aquele que escolhemos como Mestre não é um comerciante de ilusões, não é um poderoso deste mundo, nem um astuto e hábil pensador. Nós sabemos quem escolhemos seguir: é o Crucificado ressuscitado! Cristo morto por nós, Cristo ressuscitado por nós.

E a Igreja garante-nos que não ficamos desiludidos. De fato, mais ninguém a não ser Ele, nos pode dar aquele amor, aquela paz e aquela vida eterna pela qual o nosso coração aspira profundamente. Bem-aventurados seremos nós, irmãos, se formos fiéis discípulos de Cristo! Bem-aventurados seremos nós se, em todas as ocasiões, estivermos dispostos a testemunhar que este homem é verdadeiramente Filho de Deus! (Mt 27,54).


PROCISSÃO DO ENCONTRO

Os homens saem de uma igreja com a imagem de Nosso Senhor dos Passos e as mulheres saem de outra igreja com Nossa Senhora das Dores. Acontece então o doloroso encontro entre a Mãe e o Filho. O padre, então, proclama a homilia que pode ser sobre as Sete Palavras, que na verdade são sete frases:

  1. Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem. (Lc 23,34a);
  2. Hoje estarás comigo no paraíso. (Lc 23,43);
  3. Mulher eis aí o teu filho; filho eis aí a tua mãe. (Jo 19,26-27);
  4. Meu Deus, Meu Deus, porque me abandonastes? (Mc 15,34);
  5. Tenho sede. (Jo 19,28b);
  6. Tudo está consumado. (Jo 19,30a);
  7. Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito. (Lc 23,46b).

O sacerdote, diante das imagens, faz uma reflexão com estas frases, chamando o povo à conversão e à penitência. O silêncio é grande, já que a imagem de Nosso Senhor dos Passos mostra-o com a cruz às costas.

A expressão dos rostos das imagens é de dor e sofrimento. Algumas imagens de Nossa Senhora das Dores mostram-na abraçada a uma espada, lembrando certamente a profecia de Simeão: “Uma espada de dor te traspassará a alma” (Lc 2,35).

É tudo isso que vivemos neste tempo de profunda reflexão. Nossa fé é pascal, passa pelo sofrimento, morte e ressurreição do Senhor.

Sigamos os passos de Jesus, sempre com Maria.

Em seguida a procissão segue até a Igreja Matriz onde é celebrada a Santa Missa. 


SEGUNDA, TERÇA E QUARTA-FEIRA SANTA.

Esses três dias, que a Igreja chama de grandes e santos, têm, dentro do desenrolar da semana santa, uma finalidade bem definida.

Eles situam as celebrações dentro da perspectiva do Fim, eles nos relembram o sentido escatológico da Páscoa. Muito freqüentemente a Semana Santa é considerada como uma “linda tradição,” um “costume,” uma data importante do calendário.

É o acontecimento anual esperado e amado, a Festa “observada” desde a infância, durante a qual a gente se encanta com a beleza das celebrações, com a profundidade dos ritos, e na qual a gente se ocupa de preparar a ceia pascal, que não é de menor importância. . .

Depois, uma vez que tudo isto tenha acabado, nós retomamos a vida normal. Mas, teremos mesmo consciência de que “a vida normal” não é mais possível depois que o mundo rejeitou seu Salvador, depois que “Jesus ficou triste e abatido.. .,” que sua alma “ficou infinitamente triste até a morte. . .” e que ele morreu na cruz?

Foram mesmo homens “normais” que gritaram: “Crucifica-o!” Homens normais que cuspiram nele e o pregaram na cruz. . . Se eles o odiaram e o mataram, é precisamente porque ele veio sacudir e desestabilizar sua vida normal. Foi mesmo um mundo perfeitamente “normal” que preferiu as trevas e a morte, em lugar da vida e da luz. . . pela morte de Jesus o mundo “normal,” a vida “normal” foram irrevogavelmente condenados.

Ou, mais exatamente, o mundo e a vida revelaram sua natureza verdadeira e anormal, sua incapacidade de acolher a luz, o terrível poder que o mal exerce sobre eles. “É agora o julgamento deste mundo; agora será lançado fora o príncipe deste mundo.” (Jo 12,31).

A Páscoa de Jesus significa o fim para “este mundo” e, desde então, ele está “no seu fim.” Este fim pode se estender por centenas de séculos, mas isto não altera em nada a natureza dos tempos em que vivemos, que é “o último tempo.” “O rosto deste mundo passa” (1Cor 7,31).

Durante esses dias, Jesus e os discípulos preparam-se para celebrar a Páscoa, festa principal dos judeus. Porém, Jesus sabia muito bem que eram os últimos dias de sua vida. A Páscoa judaica converter-se-ia na Páscoa de Jesus; usa passagem da morte para a vida.

Por isso, o evangelho desses dias fala da intimidade de Jesus com os discípulos e de tudo que ele fez nos últimos dias. Visita os amigos de Betânia, prepara a última ceia e sofre horrivelmente com a traição de Judas.


SEGUNDA-FEIRA SANTA.

Primeira leitura: Isaías 42, 1-7
Ele não clama nem levanta a voz, nem se faz ouvir pelas ruas (Primeiro canto do Servo do Senhor).

Salmo responsorial: 26, 1-3.13-14
O Senhor é minha luz e salvação.

Evangelho: João 12, 1-11
Deixa-a; ela fez isto em vista do dia de minha sepultura.

Nesta Segunda-feira santa a liturgia nos propõe, em primeiro lugar, um texto do Dêutero-Isaías, um profeta que pregou durante o exílio, como Ezequiel, alimentando a esperança do povo, anunciando-lhe um novo êxodo do qual Deus mesmo seria o guia e no qual se renovariam os prodígios do deserto.

Trata-se de oráculos de consolo para os deportados, oráculos entre os quais aparece a figura misteriosa do Servo de Javé (Is 42,1-9; 49,1-6; 50,4-9; 52,13-53,12).

Atualmente os estudiosos da Bíblia se perguntam a quem estaria se referindo o profeta quando falava desta figura misteriosa. Seria, quem sabe, uma personalização de si mesmo ou de algum outro profeta conhecido (Jeremias)? Ou simboliza o povo perdoado e agora destinado a testemunhar a grandeza e a santidade de Deus em meio às nações? Estamos diante de uma nova figura messiânica, mais complexa que as demais encontradas na Bíblia?

Nós, cristãos, sempre vimos nele a mesma pessoa de Jesus. Na passagem que hoje lemos fala-se da predileção de Deus por seu Servo, e de como o ungiu com a plenitude de seu Espírito.

Descreve-se-lhe como um ser bondoso, humilde, paciente. Atribuem-se a ele dois atributos que foram apreciadíssimos ao longo dos séculos e nas mais diversas culturas, e que em nosso tempo, nesta mudança de milênio, continuam significando os anseios mais profundos da maior parte da humanidade: a justiça e o direito.

Ele recebe uma missão universal, não só a favor do povo eleito, mas também “das nações”, “das ilhas”, que são expressões a indicar os povos pagãos na linguagem do Antigo Testamento. O servo de Deus realizará, enfim, a esperança de uma humanidade livre, plena de vida e feliz.

Na vida e na obra de Jesus de Nazaré, especialmente em sua morte e ressurreição, os cristãos viram cumprida a missão do Servo de Javé. Servo por sua humildade e paciência, mas filho querido de Deus que o ressuscitou dentre os mortos como vamos comemorar e celebrar nesta Semana Santa.

O evangelho de João nos apresenta sua versão da unção de Jesus por parte de uma mulher. João a ambienta em Betânia, na mesma casa de Lázaro e suas irmãs, e transforma a anônima protagonista da homenagem a Jesus segundo as versões sinóticas, na mesma Maria, irmã de Marta e do recém ressuscitado Lázaro.

O gesto de Maria se converte aqui em agradecimento pela vida do irmão, em manifestação de ternura de amor feminino, que Jesus aceita plenamente. Ungiam-se com azeite perfumado os reis, os sacerdotes e até alguns profetas. Ungiam-se também os mortos, que eram banhados e perfumados antes de serem envolvidos pelo sudário com que seriam levados à sepultura.

Jesus interpreta assim o gesto de Maria: é a unção antecipada de seu corpo que vai ser torturado, morto e sepultado. É a unção do Servo de Deus, não para exercer despoticamente o poder, como os reis, nem para oferecer o culto formalístico dos sacerdotes do templo de Jerusalém. É uma unção para o serviço até a morte, para a entrega de amor à humanidade toda, ápice do ministério de Jesus, de sua pregação e de seus milagres, sinais da misericórdia de Deus.

João nos diz que Judas se escandalizou com o desperdício, pois o perfume utilizado por Maria para ungir a Jesus era de grande valor. Contrasta a generosidade da mulher como a mesquinharia do discípulo, fruto da cobiça e da traição.

Jesus anuncia aos presentes que a igreja deverá lhe render homenagem ao longo dos séculos nos pobres, que eles nunca serão pretexto para negar-lhe adoração e homenagem, pois com eles se identifica indissoluvelmente.

Dispostos já para as celebrações pascais desta Semana Santa devemos nos perguntar: que homenagem vamos render a Jesus nesta semana? Não será simplesmente o incenso ou as flores e ramos com que solenizamos estes dias, os lindos cantos, as procissões acompanhadas de velas e músicas marciais?

Jesus quer que lhe prestemos homenagem pela sua páscoa em nossos irmãos pobres e necessitados, nos compromissos de solidariedade e de serviço. Sem isto, as solenidades litúrgicas serão mero paganismo. 

AS DORES DE NOSSA SENHORA.

A invocação das ‘dores’ começou a ser pública e específica desde que o Papa Benedito XIII, em 22 de agosto de 1727, mandou que se rezasse sobre as ‘dores de Nossa Senhora’.

Mulher eis aí o teu filho; filho eis aí a tua mãe. (Jo 19,26-27).

Esses dois versículos de São João, são conhecidos como o testamento de Jesus. Jesus encontra-se já pregado na cruz, momento altíssimo da sua missão salvífica. Está próximo o momento do seu retorno para a glória do Pai. Antes de voltar para o seio do Pai, de onde Ele veio, Jesus deixa para nós, homens, a sua herança.

Entrega a João, o discípulo amado e fiel até a cruz, a maternidade de Maria. João é figura de todos os discípulos fiéis e de todos os tempos. Portanto, quando Jesus, do lenho da cruz, diz a João: “Eis a tua Mãe”; na realidade está confiando toda a sua igreja à guarda da proteção materna de Maria.

Daquele momento em diante, por desejo e ordem do próprio Jesus, a maternidade espiritual de Maria, estendeu-se sobre todos aqueles discípulos de Jesus, que como João lhe são fiéis até o fim, até a cruz; em todos os tempos e lugares onde estiver presente a sua igreja.

Também à Maria Jesus diz: “Eis o teu filho”, referindo-se a João. Pela sua fé inquestionável, Maria teve coragem de oferecer seu único e amado Filho na cruz. Provavelmente esse foi o momento mais doloroso da sua caminhada de fé. Provavelmente, na cruz, foi a última e mais difícil renovação do seu “sim” ao plano de Deus, pois humanamente tudo parecia obscuro, incerto.

Tudo parecia ter chegado ao fim e o seu sofrimento materno atingia o grau máximo. Humanamente Maria não deveria ter mais forças e nem motivos para continuar tendo esperanças. Porém, ela espera contra toda esperança.

Mais uma vez, ela se abandona totalmente no mistério divino, confiando somente na fidelidade de suas promessas. Quase que como recompensa ao seu total despojamento, que lhe faz capaz de oferecer tudo, até mesmo seu único filho.

Jesus entrega João à Maria como filho e, através dele, entrega toda a sua igreja, todos os seus discípulos fiéis de todos os tempos aos cuidados maternos de sua Mãe. Foi em base a estas palavras de Jesus na cruz, que o Papa Paulo VI, disse que nenhuma igreja pode ser verdadeiramente cristã, se não for Mariana. Nenhuma igreja que se diz cristã, não honra o seu nome, se não ama, não respeita e não venera a Virgem Maria, da qual nasceu Jesus, em quem se fundamenta toda igreja que carrega o peso do nome “cristão”.

Uma igreja cristã sem a Mãe de Jesus, seria como uma bonita construção, com colunas e paredes resistentes, mas sem telhado ou sem abertura.

Mas, a intenção de São João ao narrar-nos as últimas palavras de Jesus na Cruz, não é somente aquela de comprovar o desejo de Jesus sobre a maternidade espiritual de Maria dentro da igreja.

Nas palavras de Jesus e no fato da presença de Maria aos pés da cruz, ele quer mostrar-nos também em que consiste essa maternidade espiritual de Maria dentro da igreja. De fato, o que o evangelho quer nos ensinar, é que a maternidade espiritual de Maria sobre toda a sua igreja, não é somente um título de honra dado a Maria, mas é a justa recompensa pelo modo como a Virgem Mãe colaborou ativamente na obra salvífica do seu Filho e nosso Senhor Jesus.

A sua maternidade espiritual é a justa recompensa de Deus, pela atitude de inteira entrega e doação que Maria assumiu desde o momento em que deu o seu primeiro “sim” ao plano de Deus. Por isso mesmo, a maternidade espiritual de Maria, não é somente um privilégio, mas acima de tudo, uma nova missão que Deus lhe confia. A cooperação de Maria no calvário é o prolongamento daquele seu consenso ativo, irreversível e incondicionado dado na anunciação, mas que persiste e culmina aos pés da cruz..

Através do conceber a Jesus; gerá-lo em seu seio, nutri-lo, apresentá-lo ao Pai no templo e do seu sofrer com o filho que morre na cruz, Maria coopera de modo muito especial na obra da nossa salvação, com a sua obediência, sua fé, sua esperança e sua ardente caridade, para restaurar a vida sobrenatural de todos as almas.

Se Jesus é o homem das dores, Maria é a mulher das dores. Ela, aos pés da cruz, sofrendo com seu filho, é para todos os cristãos, modelo da perfeita união com Cristo até as últimas conseqüências. Mais importante do que a presença física de Maria entre os poucos discípulos fiéis a Cristo aos pés da cruz, é a sua comunhão íntima com o Cristo crucificado. Maria juntamente com os poucos discípulos fiéis (que representam dignamente o resto fiel de Israel), abraça aquela cruz como se fosse sua, faz sua a mensagem contida naquele gesto de Jesus.

Ela, aos pés da cruz, torna-se o modelo perfeito do verdadeiro discípulo de Cristo, que o segue até ás últimas conseqüências. Seguir a Cristo até a cruz, escândalo para os judeus e loucura para os pagãos, é o verdadeiro teste de maturidade da fé, pelo qual Maria passou e foi aprovada. Portanto, a celebração de hoje, deve nos conduzir a uma reavaliação da nossa condição cristã.

Ser cristão, não é somente dizer-se tal, ter recebido o batismo, rezar ou freqüentar a igreja. Ser cristão, é dar um sim a Deus e ser fiel a ele até as últimas conseqüências. É abraçar a cruz de Cristo e fazê-la nossa. É não perder a fé e a esperança na fidelidade de Deus, mesmo diante da dor, da incerteza e da crueldade da cruz. É saber fazer nascer a vida a partir das situações de morte, pelas quais passamos.

Que a Virgem Mãe das Dores, nos ensine a abraçar com coragem nossas cruzes, viver cristãmente nossas dores, sendo fiéis a Cristo até as últimas conseqüências.

Como viver esse dia?

Na segunda-feira santa, em nossas famílias e comunidades, começamos a criar o ambiente propício para a celebração do mistério pascal.

É bom perguntar-nos a que altura estamos no nosso processo de conversão, como estão nossas relações familiares, de grupo, como está nossa participação na vida da comunidade.

A leitura e da meditação do evangelho desse dia servirão para alimentar em nós os sentimentos e atitudes que a participação nesses dias santos nos impõe: mudança de vida, solidariedade, unidade.

Intensificamos, por isso, o espírito de oração e de serviço e nos aproximamos do sacramento da reconciliação. 


TERÇA-FEIRA SANTA.

Primeira leitura: Isaías 49, 1-6
Eu te farei luz das nações, para que minha salvação chegue até aos confins da terra (Segundo canto do Servo do Senhor) .

Salmo responsorial: 70, 1-4a.5-6ab.15.17
Minha boca anunciará vossa justiça.

Evangelho: João 13, 21-33.36-38
Um de vós me entregará… O galo não cantará antes que me tenhas negado três vezes.

Hoje também lemos um dos cantos do Servo de Javé presentes no Dêutero-Isaías (Is 42,1-9; 49,1-6; 50,4-9; 52,13-53,12). Trata-se da 2ª dessas quatro passagens que, como já dissemos em outras oportunidades, apresentam uma figura misteriosa suscitada por Deus a favor de seu povo. Esperava-se que ele fosse atuar no meio dos judeus deportados para a Babilônia e que os conduziria até levá-los de regresso à terra de seus antepassados, onde reconstruiriam o templo e a cidade santa.

O canto destaca as seguintes qualidades do Servo:

1ª) Foi escolhido desde o seio materno, expressão que na Bíblia indica sempre uma especial vocação em função da vida e da felicidade do povo, e uma especial predileção de Deus por essa pessoa.

2ª) Foi-lhe confiada a Palavra de Deus, como dão a entender as imagens da espada afiada e da flecha aguda que Deus guarda em sua aljava.

3ª) É objeto de particulares cuidados divinos, como assegura a imagem de que Deus o esconde na “sombra de sua mão”.

4ª) Enviado ao povo de Israel, entendido como as doze tribos da época monárquica, não como a única tribo de Judá, para reuni-lo depois da dispersão.

5ª) Mas também foi destinado por Deus para ser “luz das nações”, isto é, dos pagãos; para uma missão universal, ecumênica: “até aos confins da terra”.

6ª) Deve enfrentar alguma forma de sofrimento ou contradição que aqui, no 2º canto, se expressam na pergunta que o Servo faz pelo sentido de sua existência.

7ª) Finalmente, o humilde e obediente Servo de Deus será glorificado por Deus. Nos cantos posteriores, de Isaías 50 e 52, figuram mais detalhadamente os sofrimentos do Servo.

Já dissemos também que apesar das possíveis explicações históricas, os cristãos sempre viram no Servo de Isaías uma prefiguração de Jesus Cristo.

É por isso que a liturgia nos propõe as leituras destas passagens precisamente no tempo da Quaresma e da Semana Santa.

Ontem, a propósito da leitura evangélica, perguntávamos pela responsabilidade da condenação de Jesus à morte. Falávamos das autoridades religiosas judaicas dessa época, do representante do poder imperial romano…

Hoje o evangelista João nos leva a perguntarmo-nos pela nossa própria responsabilidade de cristãos na morte de Jesus. Acaso Judas não era um dos discípulos ao qual foram confiados os fundos da comunidade? Ele já tinha decidido entregar a Jesus por dinheiro. E o mesmo Pedro, líder do grupo, que ao anoitecer faz alardes de ser capaz de seguir Jesus até à morte, já o terá negado três vezes quando o galo cantar à meia-noite.

As figuras patéticas dos discípulos de Jesus que, antes da ressurreição, todavia são covardes e mesquinhos, nos devem fazer cair na conta de nossa própria situação. Até onde seremos verdadeiros discípulos do Mestre?

Estamos seguros de que não o trocaríamos pelo dinheiro? Seremos capazes de nos confessarmos seus humildes e alegres seguidores diante de quem quiser perguntar pela nossa fé? Ou, quem sabe, a covardia e o respeito humano nos levarão a negá-lo, se não de palavra, com nossas atitudes?

É bem fácil julgar os demais, ficarmos espantados com o pavoroso destino de Judas que vendeu o seu mestre, com a covardia de Pedro que o negou diante dos soldados e serventes, sem cairmos na conta de nossas muitas traições e negações quando não somos capazes de assumir conseqüentemente as exigências de nosso compromisso cristão.

Façamos hoje como o discípulo amado, esse misterioso discípulo que reclina a cabeça com íntima familiaridade sobre o peito de Jesus (Jo 13,23-26), que o acompanha até a cruz e recebe em sua casa a mãe desamparada (Jo 19,25-27), que corre ao sepulcro para ser o primeiro a manifestar a fé na ressurreição de seu mestre (Jo 20,1-10); que reconhece, também ele por primeiro, a Jesus de Nazaré, o crucificado, na misteriosa aparição às margens do lago (Jo 21,7) e sobre quem o Ressuscitado faz uma estranha predição (Jo 21,20-23).

Muito se tem especulado e discutido a respeito da identidade e significado deste personagem. A tradição o identificava automaticamente com João, o filho de Zebedeu, irmão de Tiago, considerado também como o autor do 4º evangelho. A exegese atual nele um amigo de Jesus, um autêntico discípulo, incapaz de traí-lo, incapaz de negá-lo, um cristão autêntico, um modelo para os cristãos de todos os tempos e sobretudo para nós, hoje, em nossas circunstâncias concretas 


SACRAMENTO DA RECONCILIAÇÃO (CONFISSÃO)

Celebra-se em nossa Paróquia o mutirão de Confissões – momento de festa pelo perdão de Deus. Momento de participarmos deste sacramento com muita espiritualidade e exemplo de fé e paciência.

Como viver esse dia?

Na terça-feira santa, vemos como Jesus foi traído por Judas e negado por Pedro, um dos seus mais íntimos amigos. É um convite para pensarmos em nossas relações pessoas com Jesus. Como estamos correspondendo às manifestação de seu amor?

A frase do evangelho segundo Mateus 25,40 pode ajudar-nos a encontrar a resposta correta: “… em verdade, eu vos declaro: todas as vezes que fizerdes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes”.

Sim, a resposta ao amor que Deus nos tem está no serviço e no amor que tivermos para com os irmãos mais necessitados. Que nesse dia posamos compreender a fundo essa verdade e nos decidimos a viver em consonância com ela.

É também um dia em que podemos aproximar-nos da reconciliação e das pessoas de quem estamos afastadas. 


QUARTA-FEIRA SANTA.

Primeira leitura: Isaías 50, 4-9a
Não desviei o rosto de bofetões e cusparadas (Terceiro canto do Servo do Senhor).

Salmo responsorial: 68, 8-10.21bcd-22.31.33-34
Respondei-me pelo vosso imenso amor, neste tempo favorável, Senhor Deus.

Evangelho: Mateus 26, 14-25
O Filho do Homem vai morrer, conforme diz a Escritura a respeito dele. Contudo, ai daquele que o trair.

O relato da celebração pascal de Jesus com seus discípulos está acompanhado do desmascaramento do traidor, presente no interior da comunidade. É no interior da comunidade, sobretudo, onde se trama a paixão de Jesus, já que em seu seio o Mestre é “entregado” (vv.15.16. 21.23.24.25).

Para explicar esta traição incompreensível o evangelista recorre a Zc 11,12 onde os chefes do povo dão ao profeta, enviado por Javé, um salário ridículo: trinta moedas de prata, o preço de um escravo segundo o que se estabelecera em Ex 21,32.

A descrição da traição em termos de “entrega” e o lugar da Escritura que se invoca, mostram que a ação de Judas se inscreve no desígnio de Deus, pelo qual o Filho se entrega à morte para a salvação dos homens.

Este sentido domina o relato da Ceia pascal. A entrega marcará a sua celebração. Diante da pergunta dos discípulos a respeito do lugar da celebração, Jesus ordena ir à “casa de um certo homem”. A indeterminação quer indicar que se trata de todo aquele que se sente implicado na História da Paixão. A ele, Jesus se dirige para anunciar que vai celebrar a Páscoa… com seus discípulos.

A ceia se realiza “ao cair da tarde” (v. 20) como na primeira multiplicação dos pães (Mt 14,15) e como na sepultura de Jesus (Mt 27,57). Jesus alimenta os homens mediante sua entrega. Uma nova Páscoa na qual se realiza a instituição da Eucaristia, e a morte de Jesus substitui a páscoa oficial judaica.

Mas no meio deste oferecimento de vida para os discípulos, Jesus anuncia a presença das sombras da traição que provoca em cada um deles tristeza e insegurança. O gesto de amizade e intimidade de Jesus – “por a mão no mesmo prato” – não exime dessa dolorosa possibilidade.

Desta forma a amizade se transforma em oposição entre “este Homem” e “esse indivíduo”. A ação deste último, motivada por seu amor ao dinheiro, elimina todos os valores oferecidos pelo primeiro. Renuncia para sempre o caminho da própria realização e sacrifica todo o seu ser no altar do dinheiro.

Desta forma se fecha todo acesso que conduz a uma maturidade plena. Para Judas só lhe resta a frustração e o fracasso pessoal “Seria melhor que nunca tivesse nascido!”, (v.24). Após esta afirmação lapidar sobre a sorte do traidor produz-se imediatamente a reação de Judas.

Pouco a pouco Jesus foi centrando a pergunta sobre a identidade do discípulo infiel e por isso Judas se vê obrigado a reagir. À sua pergunta Jesus responde afirmativamente. Trata-se do último intento para que o traidor repense o que havia planejado. Mas o intento fracassa porque Judas tem o coração endurecido.

A figura de Judas é um chamado à reflexão para todo discípulo de Jesus. A “entrega”, doação absolutamente gratuita de Deus e de seu Filho se transforma em “entrega”, venda que desvaloriza o dom por um preço irrisório. A ambição é o motor, capaz de transformar a amizade em vontade oposta ao querer de Deus e em frustração e fracasso da vida. 


VIA-SACRA

Neste dia fazemos a Via-Sacra nas ruas da nossa Paróquia. É um momento de demonstramos publicamente a nossa fé no Cristo que morreu por nós, mas ressuscitou no terceiro dia.

Como viver esse dia?

Em face da traição de Judas, Jesus responde com a entrega amorosa de sua vida. Está firme e decidido. “A mim não me tiram a vida; eu a entrego”. Para nós é também a hora da decisão. Com quem estamos? Com Cristo ou contra Cristo? Deus não quer que respondamos com palavras, mas sim com atos, isto é, pela nossa maneira de viver e de nos relacionarmos com o próximo. É essa a única resposta verdadeira.

Estamos sendo causa de vida, de alegria e de esperança para os que vivem perto de nós?

A traição, a falsidade e a inconsciência de Judas terão algo a nos ensinar?
Somos geradores de vida, de esperança e de união na comunidade?

A confissão sacramental que fizemos nessa semana, é uma confirmação desse caminho de conversão que passamos a trilhar desde o início da Quaresma; exprime nosso desejo de participar da paixão do Senhor, morrendo para nossa vida de egoísmo e de pecado (Rm 6,1-14).


QUINTA-FEIRA SANTA: ENCONTRO DA QUARESMA COM A PÁSCOA

Unção dos Santos Óleos

Na manhã da Quinta-feira Santa a Igreja celebra a Bênção dos Santos Óleos. Composto por óleo de oliva misturado com perfume (bálsamo) é consagrado pelo Bispo Diocesano para ser usado nas celebrações do Batismo, Crisma, Unção dos Enfermos e Ordenação.

Além disso, sempre que houver celebração com óleo, ele deve estar à disposição do ministro além de uma jarra com água, bacia, sabonete e toalha para as mãos.

Não se sabe com precisão, como e quando teve início a bênção conjunta dos três óleos litúrgicos. Fora de Roma, esta bênção acontecia em outros dias, como no Domingo de Ramos ou no Sábado de Aleluia. O motivo de se fixar a celebração na Quinta-feira Santa deve-se ao fato de ser este o último dia em que se celebra a missa antes da Vigília Pascal.

  • Óleo do Crisma: Uma mistura de óleo e bálsamo, significando plenitude do Espírito Santo, revelando que o cristão deve irradiar “o bom perfume de Cristo”. É usado no sacramento da Confirmação (Crisma) quando o cristão é confirmado na graça e no dom do Espírito Santo, para viver como adulto na fé. Este óleo é usado também no sacramento da ordem, (Sacerdotes) para ungir os “escolhidos” que irão trabalhar no anúncio da Palavra de Deus, conduzindo o povo e santificando-o no ministério dos sacramentos.
  • Óleo dos Catecúmenos: Catecúmenos são os que se preparam para receber o Batismo, sejam adultos ou crianças, antes do rito da água. Este óleo significa a libertação do mal, a força de Deus que penetra no catecúmeno, o liberta e prepara para o nascimento pela água e pelo Espírito.
  • Óleo dos Enfermos: É usado no sacramento dos enfermos, conhecido erroneamente como “extrema-unção”. Este óleo significa a força do Espírito de Deus para a provação da doença, para o fortalecimento da pessoa para enfrentar a dor e, inclusive a morte, se for vontade de Deus.

Dessa santa missa presidida pelo bispo da diocese, participam os sacerdotes de todas as paróquias para expressar, de modo particular, a união da comunidade eclesial e renovar o sacramento da ordem.


MISSA DA CEIA DO SENHOR

Primeira leitura: Êxodo 12,1-8.11-14
Ritual da ceia pascal. 

Salmo responsorial: 115, 12-13.15-18
O cálice por nós abençoado é a nossa comunhão com o sangue do Senhor. 

Segunda leitura: 1 Cor 11,23-26
Todas as vezes que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, proclamais a morte do Senhor.

Evangelho: João 13,1-15
Amou-os até o fim.

O último dia da Quaresma (até a hora das vésperas). Com a “Santa Missa da ceia do Senhor”, abre o tríduo pascal. O termo deriva do latim “tres dies”, ou seja, três dias dedicados a celebrações e orações especiais. É também o “dia da entrega”: Judas entrega Jesus aos seus inimigos, Cristo se entrega para a Igreja na Eucaristia.

A liturgia da Quinta-feira Santa é um convite a aprofundar concretamente no mistério da Paixão de Cristo, já que quem deseja segui-lo deve sentar-se à sua mesa e, com o máximo recolhimento, ser espectador de tudo o que aconteceu na noite em que iam entregá-lo.

E por outro lado, o mesmo Senhor Jesus nos dá um testemunho idôneo da vocação ao serviço do mundo e da Igreja que temos todos os fiéis quando decide lavar os pés dos seus discípulos.

Neste sentido, o Evangelho de São João apresenta a Jesus ‘sabendo que o Pai pôs tudo em suas mãos, que vinha de Deus e a Deus retornava’, mas que, ante cada homem, sente tal amor que, igual como fez com os discípulos, se ajoelha e lava os seus pés, como gesto inquietante de uma acolhida inalcançável.

São Paulo completa a representação recordando a todas as comunidades cristãs o que ele mesmo recebeu: que aquela memorável noite a entrega de Cristo chegou a fazer-se sacramento permanente em um pão e em um vinho que convertem em alimento seu Corpo e seu Sangue para todos os que queiram recordá-lo e esperar sua vinda no final dos tempos, ficando assim instituída a Eucaristia.

A Santa Missa é então a celebração da Ceia do Senhor na qual Jesus, um dia como hoje, na véspera da sua paixão, “Durante a refeição, Jesus tomou o pão, benzeu-o, partiu-o e o deu aos discípulos, dizendo: Tomai e comei, isto é meu corpo.” (Mt 26, 26).

Ele quis que, como em sua última Ceia, seus discípulos nos reuníssemos e nos recordássemos d’Ele abençoando o pão e o vinho: “Fazei isto em memória de mim” (Lc 22,19).

Antes de ser entregue, Cristo se entrega como alimento. Entretanto, nesta Ceia, o Senhor Jesus celebra sua morte: o que fez, o fez como anúncio profético e oferecimento antecipado e real da sua morte antes da sua Paixão. Por isso “Assim, todas as vezes que comeis desse pão e bebeis desse cálice lembrais a morte do Senhor, até que venha” (1Cor 11, 26).

Assim podemos afirmar que a Eucaristia é o memorial não tanto da Última Ceia, e sim da Morte de Cristo que é Senhor, e “Senhor da Morte”, isto é, o Ressuscitado cujo regresso esperamos de acordo com a promessa que Ele mesmo fez ao despedir-se: “Ainda um pouco de tempo, e já me não vereis; e depois mais um pouco de tempo, e me tornareis a ver, porque vou para junto do Pai.” (Jo 16, 16).

Como diz o prefácio deste dia: “Cristo verdadeiro e único sacerdote, se ofereceu como vítima de salvação e nos mandou perpetuar esta oferenda em sua comemoração”. Porém esta Eucaristia deve ser celebrada com características próprias: como Missa “na Ceia do Senhor”.

Nesta Missa, de maneira distinta a todas as demais Eucaristias, não celebramos “diretamente” nem a morte nem a ressurreição de Cristo. Não nos adiantamos à Sexta-feira Santa nem à noite de Páscoa.

Hoje celebramos a alegria de saber que esta morte do Senhor, que não terminou no fracasso, mas no êxito, teve um por quê e um para quê: foi uma “entrega”, um “dar-se”, foi “por algo”ou melhor dizendo, “por alguém” e nada menos que por “nós e por nossa salvação” (Credo). “Ninguém a tira de mim, (Jesus se refere à sua vida) mas eu a dou livremente. Tenho poder de entregá-la e poder de retomá-la.” (Jo 10, 18), e hoje nos diz que foi para “remissão dos pecados” (Mt 26, 28).

Por isso esta Eucaristia deve ser celebrada o mais solenemente possível, porém, nos cantos, na mensagem, nos símbolos, não deve ser nem tão festiva nem tão jubilosamente explosiva como a Noite de Páscoa, noite em que celebramos o desfecho glorioso desta entrega, sem a qual tivesse sido inútil; tivesse sido apenas a entrega de alguém mais que morre pelos pobres e não os liberta.

Porém não está repleta da solene e contrita tristeza da Sexta-feira Santa, porque o que nos interessa “sublinhar” neste momento, é que “o Pai entregou o Seu Filho para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3, 16) e que o Filho entregou-se voluntariamente a nós apesar de que fosse através da morte em uma cruz.

Hoje há alegria e a Igreja rompe a austeridade quaresmal cantando o “glória”: é a alegria de quem se sabe amado por Deus; porém ao mesmo tempo é sóbria e dolorida, porque conhecemos o preço que Cristo pagou por nós.

Poderíamos dizer que a alegria é por nós e a dor por Ele. Entretanto predomina o gozo porque no amor nunca podemos falar estritamente de tristeza, porque aquele que dá e se entrega com amor e por amor, o faz com alegria e para dar alegria.

Podemos dizer que hoje celebramos com a liturgia (1a. Leitura) a Páscoa. Porém a da Noite do Êxodo (Ex 12) e não a da chegada à Terra Prometida (Js 5, 10).

Hoje inicia a festa da “crise pascoal”, isto é, da luta entre a morte e a vida, já que a vida nunca foi absorvida pela morte, mas sim combatida por ela. A noite do sábado de Glória é o canto à vitória, porém tingida de sangue, e hoje é o hino à luta, mas de quem vence, porque sua arma é o amor.


A Celebração

Entrada: Solene
Ato Penitencial
Glória:
 tocam-se os sinos
Celebração da Palavra: refletir sobre a Eucaristia – Sacerdócio – Caridade Fraterna
Lava-pés: após a homilia o Sacerdote sem casula lava os pés de doze pessoas.
Oração dos fiéis
Omite-se o creio
Liturgia Eucarística
Comunhão:
 após a comunhão a reserva eucarística é colocada sobre o altar. Conclui-se a missa com a oração depois da comunhão. 


Transladação do Santíssimo Sacramento

O sacerdote de pé ante o altar, põe incenso no turíbulo e, ajoelhando-se, incensa o Santíssimo 3 vezes. Recebe o véu umeral, toma a âmbula e o recobre como o véu. Em seguida organiza-se a Procissão e Transladação do Santíssimo Sacramento para um lugar previamente organizado.

Chegando ao local o sacerdote deposita a âmbula no tabernáculo.

Colocando incenso no turíbulo, ajoelha-se e incensa o Santíssimo Sacramento enquanto se canta Tão Sublime Sacramento.

Após alguns momentos de adoração silenciosa, o sacerdote e os ministros fazem genuflexão e se retiram.

Os fiéis sejam exortados a adorarem o Santíssimo Sacramento, durante a noite, contudo após a meia-noite esta adoração seja feita sem nenhuma solenidade. 

Como viver esse dia?

A quinta-feira santa é um dia cheio de calor humano, em que acolhemos as grandes dádivas que o Senhor nos deixou como herança. Um dia inteiro para refazer os vínculos que nos unem como irmãos na fé.

Enquanto agradecemos os grandes dons do Senhor – eucaristia, sacerdócio e mandamento do amor -, perdoando-nos uns aos outros, vivendo uma jornada de reconciliação e de unidade.

Não é necessário fazer coisas extraordinárias ou difíceis; basta abrir o coração e realizar os pequenos gestos de amor e fraternidade que alegram tanto a alma e são como bálsamo que cura as feridas.

Sejamos generosos, hoje, e meticulosos no carinho e na gratidão. Que se consolidem hoje nossos vínculos de comunhão com o Senhor e entre nós; que nossa comunidade renasça na participação da eucaristia; que em nossas famílias seja construída a unidade.

Em nossa oração pessoal, diante do altar da reposição ou do altar do Santíssimo, louvemos e agradeçamos ao Senhor pelo precioso dom da eucaristia, pelas pessoas que nos prestam algum serviço, pelos sacerdotes que nos batizaram, que nos absolveram de nossos pecados, em nome do Senhor. Roguemos pelos sacerdotes de nossa paróquia que doam sua vida pela comunidade e por todos nós.

A visita ao Santíssimo é uma expressão de fé no sacramento da eucaristia; por isso é feito em espírito de oração, numa atitude de respeito, amor e gratidão a Deus, e não simplesmente por hábito.


SEXTA-FEIRA SANTA

Nas matinas, a oração dá o tema do dia: a oposição entre o amor do Cristo e o desejo insaciável de Judas:

A Igreja nos recorda a traição de Judas, a agonia no Monte das Oliveiras, a condenação de Jesus; a sua crucifixão e o seu sepultamento na espera da Ressurreição ao terceiro dia.

Na sexta-feira santa, não há missa em nenhuma igreja. Neste dia não se celebra a Divina Liturgia, em sinal de luto pela morte e sepultamento do Cristo Jesus. O ato litúrgico principal é a celebração da paixão do Senhor.

Da luz da grande Quinta-feira passamos às trevas da Sexta-feira, o dia da Paixão do Cristo, de sua morte e de sua sepultura. A Igreja primitiva chamava a este dia “A Páscoa da Cruz,” porque ele é de fato o começo desta Páscoa ou Passagem cujo sentido nos será revelado progressivamente; primeiro na paz do grande e santo Sabbat, depois na alegria do dia da Ressurreição.

Mas antes, as trevas. Há dois mil anos, sim, homens “maus” mataram o Cristo, mas hoje nós “o bom povo cristão” levantamos suntuosos túmulos em nossas igrejas; não é esta a prova da nossa justiça?

E no entanto, a Sexta-feira Santa não concerne somente ao passado. É o dia do Pecado, o dia do Mal, o dia no qual a Igreja nos ensina a aprender a terrível realidade do pecado e seu poder no mundo.

Pois o pecado e o mal não desapareceram: ao contrário, permanecem no mundo e em nossa vida. Nós que nos dizemos cristãos não entramos freqüentemente nesta lógica do mal que conduziu o Sinédrio e Pilatos, os soldados romanos e toda a multidão a detestar, torturar e matar o Cristo?

De que lado nós teríamos ficado se tivéssemos vivido em Jerusalém no tempo de Pilatos?

Esta é a pergunta que nos é feita por cada uma das palavras do ofício de Sexta-feira Santa. É de fato “o dia deste mundo,” de sua condenação real e não somente simbólica, e do julgamento real e não somente ritual, de nossa vida. . .

É a revelação da verdadeira natureza do mundo que preferiu então e continua a preferir as trevas à luz, o pecado ao bem, a morte à vida. E condenando o Cristo à morte “este mundo” condenou-se a si mesmo à morte, e na medida em que aceitamos seu espírito, seu pecado e sua traição a Deus, estamos também condenados. . .

Este é o primeiro significado, terrivelmente realista, da Sexta-feira Santa: uma condenação à morte…

No entanto, este dia do Mal cuja manifestação e triunfo estão em seu paroxismo, é também o dia da Redenção.

A morte do Cristo nos é revelada como uma morte salvífica para nós e para nossa salvação. Ela é uma morte salvífica porque é o supremo e perfeito sacrifício.

O Cristo dá sua vida a seu Pai e no-la dá também por nós. Ele a dá a seu Pai porque não há outro meio de destruí-la e libertar os homens dela; ora, é a vontade do Pai que os homens sejam salvos da morte.

O Cristo nos dá sua vida porque na verdade é em nosso lugar que Ele morre. A morte é o fruto natural do pecado, um castigo iminente.

O homem escolheu não mais estar em comunhão com Deus, porém como ele não tem a vida nele mesmo e por ele mesmo, morre. Em Jesus Cristo, entretanto, não há pecado, logo não há morte.

É somente por amor a nós que ele aceita morrer; Ele quer assumir e compartilhar de nossa condição humana até o fim. Ele aceita o castigo de nossa natureza, exatamente como assumiu o fardo inerente à natureza humana.

Ele morre porque se identifica verdadeiramente conosco, tomou sobre si a tragédia da vida do homem. Sua morte é então a revelação suprema de sua compaixão e de seu amor. E porque sua morte é amor, compaixão e co-sofrimento, nela a própria natureza da morte foi mudada. Ela não é mais um castigo, mas um esplendoroso ato de amor e de perdão, o termo de toda ausência de comunhão e de toda solidão. A condenação é transformada em perdão.

Enfim, a morte do Cristo é uma morte salvífica porque destrói a própria fonte da morte: o mal. Aceitando-a por amor, entregando-se a seus carrascos e permitindo-lhes uma vitória aparente, o Cristo manifesta que em realidade esta vitória é a derrota decisiva e total do mal.

Com efeito, para ser vitorioso, o pecado deve aniquilar o bem, deve provar que ele é toda a realidade da vida, arruinar o bem e, numa palavra, mostrar sua própria superioridade; mas ao longo de sua Paixão, é o Cristo e somente ele que triunfa.

O mal nada pode contra ele, pois que não pode levar o Cristo a aceitar o mal como verdade. A hipocrisia se revela hipocrisia, o assassinato, assassinato, e o medo, medo. E enquanto o Cristo avança silenciosamente para a Cruz e para seu fim, quando a tragédia humana está em seu apogeu, seu triunfo, sua vitória sobre o mal e sua glorificação aparecem progressivamente em luz plena.

A cada passo esta vitória é reconhecida, confessada, proclamada: pela mulher de Pilatos, por José, pelo bom ladrão, pelo centurião. Quando ele morre na cruz, tendo aceito o supremo horror da morte, a solidão absoluta (Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?)” não resta senão confessar: “Verdadeiramente este homem era o filho de Deus!”

Assim esta morte, este amor e esta obediência, esta plenitude de vida destroem aquilo que faz da morte o destino universal. “E os túmulos foram abertos” (Mt. 27,52). Já aparecem os primeiros clarões da Ressurreição…

Este é o duplo mistério desta grande Sexta-feira; os ofícios deste dia no-lo mostram e nos fazem participar dele. De um lado, eles insistem constantemente sobre a Paixão do Cristo enquanto pecado de todos os pecados, crime de todos os crimes.

A tarde de Sexta-feira Santa apresenta o drama imenso da morte de Cristo no Calvário. A cruz erguida sobre o mundo segue de pé como sinal de salvação e de esperança. Com a Paixão de Jesus segundo o Evangelho de João contemplamos o mistério do Crucificado, com o coração do discípulo Amado, da Mãe, do soldado que lhe traspassou o lado.

São João, teólogo e cronista da paixão nos leva a contemplar o mistério da cruz de Cristo como uma solene liturgia. Tudo é digno, solene, simbólico em sua narração: cada palavra, cada gesto. A densidade de seu Evangelho agora se faz mais eloqüente. E os títulos de Jesus compõem uma formosa Cristologia.

Jesus é Rei. O diz o título da cruz, e o patíbulo é o trono onde ele reina. É de uma só vez, sacerdote e templo, com a túnica sem costura com que os soldados tiram a sorte. É novo Adão junto à Mãe, nova Eva, Filho de Maria e Esposo da Igreja. É o sedento de Deus, o executor do testamento da Escritura. O Doador do Espírito. É o Cordeiro imaculado e imolado, o que não lhe romperam os ossos. É o Exaltado na cruz que tudo o atrai a si, quando os homens voltam a ele o olhar.

A Mãe estava ali, junto à Cruz. Não chegou de repente no Gólgota, desde que o discípulo amado a recordou em Caná, sem ter seguido passo a passo, com seu coração de Mãe no caminho de Jesus. E agora está ali como mãe e discípula que seguiu em tudo a sorte de seu Filho, sinal de contradição como Ele, totalmente ao seu lado. Mas solene e majestosa como uma Mãe, a mãe de todos, a nova Eva, a mãe dos filhos dispersos que ela reúne junto à cruz de seu Filho.

Maternidade do coração, que infla com a espada de dor que a fecunda. A palavra de seu Filho que prolonga sua maternidade até os confins infinitos de todos os homens. Mãe dos discípulos, dos irmãos de seu Filho.

A maternidade de Maria tem o mesmo alcance da redenção de Jesus. Maria contempla e vive o mistério com a majestade de uma Esposa, ainda que com a imensa dor de uma Mãe. São João a glorifica com a lembrança dessa maternidade. Último testamento de Jesus. Última dádiva. Segurança de uma presença materna em nossa vida, na de todos. Porque Maria é fiel à palavra: Eis aí o teu filho.

O soldado que traspassou o lado de Cristo no lado do coração, não se deu conta que cumpria uma profecia realizava um último, estupendo gesto litúrgico. Do coração de Cristo brota sangue e água. O sangue da redenção, a água da salvação. O sangue é sinal daquele maior amor, a vida entregue por nós, a água é sinal do Espírito, a própria vida de Jesus que agora, como em uma nova criação derrama sobre nós.


A Celebração

O altar é iluminado com pouca luz, sem cruz, sem velas nem adornos. Recordamos a morte de Jesus.

Entrada
A impressionante celebração litúrgica da Sexta-feira começa com um rito de entrada diferente de outros dias: os ministros entram em silêncio, sem canto, vestidos de cor vermelha, a cor do sangue, do martírio, se prostram no chão, enquanto a comunidade se ajoelha, e depois de um espaço de silêncio, reza a oração do dia.

Celebração da Palavra 
Primeira leitura: Isaías 52,13 – 53,12

Espetacular realismo nesta profecia feita 800 anos antes de Cristo, chamada por muitos o 5º Evangelho. Que nos introduz a alma sofredora de Cristo, durante toda sua vida e agora na hora real de sua morte. Disponhamo-nos a vivê-la com Ele.

Salmo responsorial: 30, 2.6.12-13.15-17.25 
Neste Salmo, recitado por Jesus na cruz, entrecruzam-se a confiança, a dor, a solidão e a súplica: com o Homem das dores, façamos nossa oração.

Segunda leitura: Hebreus 4,14-16; 5,7-9
O Sacerdote é o que une Deus ao homem e os homens a Deus… Por isso Cristo é o perfeito Sacerdote: Deus e Homem. O Único e Sumo e Eterno Sacerdote. Do qual o Sacerdócio: o Papa, os Bispos, os sacerdotes e dos Diáconos unidos a Ele, são ministros, servidores, ajudantes…

Evangelho: João 18,1-19,42 
Paixão de Jesus Cristo.

Depois da homilia conclui-se com uma ORAÇÃO UNIVERSAL, que hoje tem mais sentido do que nunca: precisamente porque contemplamos a Cristo entregue na cruz como Redentor da humanidade, pedimos a Deus a salvação de todos, crentes e não crentes.

Adoração da Cruz
Depois das palavras passamos a um ato simbólico muito expressivo e próprio deste dia: a veneração da santa cruz que fez na Semana Santa, não somente o sacerdote – como até então – mas também os fiéis podem comungar com o Corpo de Cristo.

Ainda que hoje não haja propriamente Eucaristia, mas comungando do Pão consagrado na celebração de ontem, Quinta-feira Santa, expressamos nossa participação na morte salvadora de Cristo, recebendo seu “Corpo entregue por nós”. 

Como viver esse dia?
Enquanto nos vemos mergulhados na lembrança da morte do Senhor, observamos à nossa volta como Jesus continua, hoje, morrendo em tantos irmãos, vítimas de nosso egoísmo e das estruturas injustas que maltratam ou destroem a vida. No entanto, alimentamos a certeza de que a ressurreição e a vida triunfarão sobre a violência e sobre a morte.

Enquanto Jesus verte até a última gota de sangue para se solidarizar com nossa condição de fragilidade e de pecado, nós, membros de seu Corpo Místico (que é a Igreja) continuadores de seu projeto, não podemos permanecer indiferente, tranqüilos. A morte do Senhor tira-nos do individualismo e nos faz passar de um coração carnal para um coração sensível, humano e solidário.

Como poderemos passar esse dia, tão grande no significado, desinteressados pelos sofrimentos de nossos familiares, vizinhos. Amigos ou pessoas que necessitam até do mínimo para viver? Hoje, a igreja convida-nos ao jejum como expressão de penitência e solidariedade em relação à morte do Senhor. Para que nosso jejum também seja expressão de solidariedade em relação aos nossos irmãos, em cujas pessoas Cristo continua morrendo,saiamos a seu encontro oferecendo-lhes nossa ajuda, nossa dedicação.

Seria conveniente convidarmos à nossa mesa algumas pessoas ou famílias necessitadas, ou alguém com quem pretendemos reatar nossa amizade. Nos grupos ou movimentos paroquiais, pode-se organizar uma coleta de gêneros em favor das famílias mais necessitadas.

Na celebração vespertina da paixão, renunciemos por amor ao Senhor, a todas as sementes de morte que existe em nosso coração, em nossa família, na comunidade e em nosso povo e peçamos a ele que transforme tudo isso em semente de vida e de esperança.

Quando chegar o momento da adoração da cruz, tenhamos presente que não estamos diante de um simples madeiro, mas sim que osculamos e nos curvamos diante da cruz banhada com o sangue do Redentor, o que constituiu uma só realidade, pois, sendo ele quem deu a vida por nós, é a ele que adoramos e agradecemos.

Ao comungar, unamo-nos a Jesus, que dá a vida por nós, comprometendo-nos a renunciar o nosso egoísmo e ao mesmo tempo nos mostrando solidários em relação às pessoas nas quais Cristo continua morrendo em nossos dias: enfermos, pobres, esquecidos da sociedade.

Nossa participação na tradicional procissão do Senhor Morto, nesse dia, não representa uma procissão qualquer, ou a participação numa peça teatral religiosa. Vamos à procissão para acompanhar Jesus – revivendo com gratidão e amor sua paixão, descobrindo o sentido verdadeiro da cruz, se sabemos carregá-la com amor – e ajudar o próximo, dando um pouco de “vida” aos que estão à nossa volta.


SÁBADO SANTO

O Sábado Santo não é um dia vazio em que “não acontece nada”. Nem uma duplicação da Sexta-feira Santa.

A grande lição é esta: Cristo está no sepulcro, desceu à mansão dos mortos, ao mais profundo em que pode ir uma pessoa.

E junto a Ele, como sua Mãe Maria, está a Igreja, a esposa. Calada, como ele. O Sábado está no próprio coração do Tríduo Pascal. Entre a morte da Sexta-feira e a ressurreição do Domingo nos detemos no sepulcro.

Um dia ponte, mas com personalidade. São três aspectos -não tanto momentos cronológicos de um mesmo e único mistério, o mesmo da Páscoa de Jesus: morto, sepultado, ressuscitado: “…se despojou de sua posição e tomou a condição de escravo…se rebaixou até se submeter inclusive à morte, quer dizer, conhecesse o estado de morte, o estado de separação entre sua alma e seu corpo, durante o tempo compreendido entre o momento em que Ele expirou na cruz e o momento em que ressuscitou.

Este estado de Cristo morto é o mistério do sepulcro e da descida à mansão dos mortos. É o mistério do Sábado Santo em que Cristo depositado na tumba manifesta o grande repouso sabático de Deus depois de realizar a salvação dos homens, que estabelece na paz o universo inteiro”.

O próprio Cristo está calado. Ele, que é Verbo, a Palavra, está calado. Depois de seu último grito da cruz “por que me abandonaste?”, agora ele cala no sepulcro. Descansa: “tudo está consumado”. Mas este silêncio pode ser chamado de plenitude da palavra. O assombro é eloqüente, “resplandece o mistério da Cruz”.

É um dia de meditação e silêncio. Algo parecido à cena que nos descreve o livro de Jó, quando os amigos que foram visitá-lo, ao ver o seu estado, ficaram mudos, atônitos frente à sua imensa dor: “Sentaram-se no chão ao lado dele, sete dias e sete noites, sem dizer-lhe uma palavra, vendo como era atroz seu sofrimento” (Jó. 2, 13).

Durante o Sábado santo a Igreja permanece junto ao sepulcro do Senhor, meditando sua paixão e sua morte, sua descida à mansão dos mortos e esperando na oração e no jejum sua ressurreição.

Se a fé, ungida de esperança, não visse no horizonte último desta realidade, cairíamos no desalento: “nós o experimentávamos… “, diziam os discípulos de Emaús.

Vigília Pascal: “a mãe de todas as vigílias”

A celebração é no sábado à noite, é uma Vigília em honra ao Senhor, (Ex 12, 42), de maneira que os fiéis, seguindo a exortação do Evangelho (Lc 12, 35-36), tenham acesas as lâmpadas como os que aguardam a seu Senhor quando chega, para que, ao chegar, os encontre em vigília e os convide a sentar à sua mesa.

A Páscoa do Senhor, nossa Páscoa

Todos os elementos especiais da Vigília querem ressaltar o conteúdo fundamental da Noite: a Páscoa do Senhor, a sua passagem da Morte à Vida.
Nesta noite, com mais razão que em nenhum outro momento, a Igreja louva a Deus porque “Cristo, nossa Páscoa, foi imolado” (Prefácio I de Páscoa).

Porém a Páscoa de Cristo é também a nossa Páscoa: “na morte de Cristo nossa morte foi vencida e em sua ressurreição ressuscitamos todos” (Prefácio II de Páscoa).

A comunidade cristã se sente integrada, “contemporânea da Passagem de Cristo através da morte à vida”. Ela mesma renasce e goza na “nova vida que nasce do mistério pascal” (oração sobre as ofertas da Vigília): pelo Batismo se submerge com Cristo em sua Páscoa, pela Confirmação recebe também ela o Espírito da Vida, e na Eucaristia participa do Corpo e Sangue de Cristo, como memorial de sua morte e ressurreição.

Os textos, orações, cantos todos apontam a esta gozosa experiência da Igreja unida ao seu Senhor, centralizada nos sacramentos pascais. Esta é a melhor chave para a espiritualidade cristã, que deve centralizar-se mais que na contemplação das dores de Jesus (a espiritualidade da Sexta-feira Santa é a mais fácil de assimilar), na comunhão com o Ressuscitado dentre os mortos.

Cristo, ressuscitando, venceu a morte.

Esta é na verdade “o dia que o Senhor fez para nós”. O fundamento de nossa fé. A experiência decisiva de que a Igreja, como Esposa unida ao Esposo, recorda e vive cada ano renovando sua comunhão com Ele, na Palavra e nos Sacramentos desta Noite.

BÊNÇÃO DO FOGO E PREPARAÇÃO DO CÍRIO

Fora da Igreja, prepara-se a fogueira. Estando o povo reunido em volta o sacerdote abençoa o fogo novo. Em seguida o círio pascal é apresentado ao sacerdote. Com um estilete, o presidente faz nele uma cruz dizendo as palavras que falam da eternidade de Cristo. 

Cristo, ontem e hoje (faz a incisão na haste vertical):
Princípio e Fim (faz a incisão na haste horizontal);
Alfa (grava a letra alfa no alto da haste vertical);
E Ômega (grava a letra ômega embaixo na haste vertical);
A Ele o tempo (grava o primeiro algarismo do ano em curso no ângulo esquerdo superior da cruz);
E a eternidade (grava o segundo algarismo no ângulo direito superior);
A glória e o poder (grava o terceiro algarismo no ângulo esquerdo inferior);
Pelos séculos sem fim. Amém (grava o quarto algarismo no ângulo direito inferior)

Assim expressa com gestos e palavras toda a doutrina do império de Cristo sobre o cosmos, exposta em São Paulo. Nada escapa da Redenção do Senhor, e tudo, homens, coisas e tempo estão sob sua potestade.

Agora o sacerdote aplica os grãos de incenso, que simbolizam as chagas de Jesus, dizendo:

Por suas chagas (primeiro grão de incenso na ponta superior da haste vertical da cruz);
Suas chagas gloriosas (segundo grão de incenso no meio da cruz);
O Cristo Senhor (terceiro grão de incenso no ponto inferior da haste vertical);
Nos proteja (quarto grão de incenso na ponta esquerda da haste horizontal);
E nos guarde (quinto grão de incenso na ponta direita da haste horizontal). 
O sacerdote acende o círio pascal com o fogo novo, dizendo:
A luz do Cristo que ressuscita resplandecente dissipe as travas de nosso coração e nossa mente. 


PROCISSÃO DO CÍRIO PASCAL

Após acender o círio pascal que representa o Cristo Ressuscitado, a coluna de fogo e de luz que nos guia através das trevas e nos indica o caminho à terra prometida, avança em procissão.

Estas experiências devem ser vividas com uma alma de criança, singela mas vibrante, para estar em condições de entrar na mentalidade da Igreja neste momento de júbilo. O mundo conhece demasiadamente bem as trevas que envolvem a sua terra em desgraça e tormento. Porém, nesta hora, se pode dizer que sua desventura atraiu a misericórdia e que o Senhor quer invadir a toda realidade com torrentes de sua luz.

Já os profetas haviam prometido a luz: “O Povo que caminha em meio às trevas viu uma grande luz”, escreve Isaías (Is 9,1; 42,7; 49,9). Esta luz que amanhecerá sobre a Nova Jerusalém (Is 60,1-3) será o próprio Deus vivo, que iluminará o seu povo e seu Servo será a luz das nações (Is 42,6; 49,6).

O catecúmeno (se houver Batismo) que participa nesta celebração da luz sabe por experiência própria que desde seu nascimento está em meio às trevas; mas tem o conhecimento de que Deus “o chamou para sair das trevas e a entrar em sua luz maravilhosa” (1 Pd 2,9). Dentro de uns momentos, na pia batismal, “Cristo será sua luz” (Ef 5, 14). Passará das trevas à “luz no Senhor” (Ef 5,8).

As luzes da igreja devem permanecer apagadas. O diácono toma o círio e o ergue por algum tempo proclamando:

Eis a luz de Cristo! 
Todos respondem:
Demos graças a Deus!

Todos se dirigem para a igreja precedido pelo diácono com o cicio pascal. O turiferário com o turíbulo vai à frente.

À porta da igreja o diácono pára e, erguendo o círio proclama:
Eis a luz de Cristo!
Todos respondem:
Demos graças a Deus!

Os fiéis acendem suas velas no fogo do círio pascal e entram na igreja.

Ao chegar diante do altar, o diácono volta-se para o povo e proclama pela terceira vez: 
Eis a luz de Cristo! 
Todos respondem:
Demos graças a Deus! 


PROCLAMAÇÃO DA PÁSCOA

O povo permanece em pé com as velas acesas. O presidente da celebração incensa o círio pascal. Em seguida a Páscoa é proclamada.

Este hino de louvor, em primeiro lugar, anuncia a todos a alegria da Páscoa, alegria do céu, da terra, da Igreja, da assembléia dos cristãos. Esta alegria procede da vitória de Cristo sobre as trevas. Terminada a proclamação apagam-se as velas. 


LITURGIA DA PALAVRA

Todos estando sentados o sacerdote convida a ouvirem a Palavra de Deus. 
Esta noite a comunidade cristã se detém mais que o usual na proclamação da Palavra. Tanto o Antigo como o Novo Testamento falam de Cristo e iluminam a História da Salvação e o sentido dos sacramentos pascais. Há um diálogo entre Deus que se dirige ao seu Povo (as leituras) e o Povo que Lhe responde (Salmos e orações).

As leituras da Vigília têm uma coerência e um ritmo entre elas. A melhor chave é a que nos deu o próprio Cristo: “E começando por Moisés, percorrendo todos os profetas, explicava-lhes (aos discípulos de Emaús) o que dele se achava dito em todas as Escrituras” (Lc 24, 27).

Após cada salmo o sacerdote reza a oração correspondente. 

Primeira leitura: Gênesis 1,1-2,2
Deus viu tudo quanto havia feito e eis que tudo era muito bom.

Salmo responsorial: 103
Enviai o vosso Espírito, Senhor, e da terra toda a face renovai.

Segunda leitura: Gênesis 22,1-18
O sacrifício de nosso Pai Abraão.

Salmo responsorial: 15
Guardai-me, ó Deus, porque em vós me refugio!

Terceira leitura: Êxodo 14,15-15,1
Os filhos de Israel entraram pelo meio do mar a pé enxuto.

Salmo responsorial: Êxodo 15
Cantemos ao Senhor que fez brilhar a sua glória!

Quarta leitura: Isaías 54, 5-14
Com misericórdia eterna, eu o teu Senhor, compadeci-me de ti.

Salmo responsorial: 29
Eu vos exalto, ó Senhor, porque vós me livrastes!

Quinta leitura: Isaías 55, 1-11
Vinde a mim, ouvi e tereis vida; farei convosco um pacto eterno.

Salmo responsorial: Isaías 12
Com alegria bebereis do manancial da salvação.

Sexta leitura: Baruc 3, 9-15.32-4,4
Marcha para o esplendor do Senhor.

Salmo responsorial: 18
Senhor, tens palavras de vida eterna.

Sétima leitura: Ezequiel 36,16-17a.18.28
Derramarei sobre vós uma água pura e dar-vos-ei um coração novo.

Salmo responsorial: 41
A minh’alma tem sede de Deus.

Após o Salmo e a oração da última leitura ao Antigo Testamento, acendem-se as velas do altar e canta-se solenemente o Hino de Louvor. Onde for costume tocam-se os sinos. 

Epístola: Romanos 6, 3-11
Cristo ressuscitado dos mortos não morre mais.

Salmo responsorial: 117
Aleluia, Aleluia, Aleluia.

Evangelho: Lc 24.1-12
Por que buscam entre os mortos ao que está vivo.

O último salmo responsorial canta o amor do Senhor que, em sua atuação, colocou aquilo que foi considerado sem importância como pedra angular de suas construções.

A afirmação que a tradição sinótica (Mt 21,42; Mc 12,10-11; Lc 20,17) utiliza em função da explicação da parábola dos vinhateiros homicidas, oferece o sentido mais profundo para a celebração pascal dos cristãos.

Desde a milagrosa passagem pelo Mar Vermelha, proposta pela leitura do Êxodo (de leitura obrigatória nesta Vigília) até o significado do batismo para os membros da comunidade, ensinado pela Carta aos Romanos, essa ação divina manifesta os traços de um Deus que liberta de toda escravidão. 

O ponto de referência e o selo que autentica toda libertação não podem ser outro senão o triunfo de Jesus sobre a morte, o relato de sua ressurreição, transmitido pela passagem do evangelho.

Nele, adquire relevância a amplitude cósmica do acontecimento que se expressa através da indicação do tempo: “no primeiro dia da semana” e com a menção do tremor de terra que acompanha a descida do anjo do Senhor. Trata-se do começo de uma nova criação como em Gn 1,5 que inaugura a Parusia definitiva da Vinda do Filho do homem que envia os seus anjos (Mt 24,30-31).

Aqui o anjo aparece revestido da glória divina: “sua aparência era como um relâmpago e suas vestes eram brancos como a neve”. Sua ação é descrita dizendo-se que “retirou a pedra e sentou-se nela”.

Através dele, Deus se faz presente para manifestar sua vitória sobre a morte. A pedra que separava o mundo dos mortos do mundo dos vivos foi retirada e dominada. A força irreversível da morte foi derrotada pela ação de Deus realizada em Jesus, o primogênito dentre os mortos.

O mundo novo da linguagem apocalíptica do livro de Daniel que falava de um homem vestido de linho com aspecto de relâmpago começou.

“Levantando os olhos, vi um homem vestido de linho. Cingia-lhe os rins um cinto de ouro de Ufaz. Seu corpo era como o crisólito; seu rosto brilhava como o relâmpago, seus olhos, como tochas ardentes, seus braços e pés tinham o aspecto do bronze polido e sua voz ressoava como o rumor de uma multidão” (Dn 10,5-6). 

Diante de uma visão tão surpreendente a reação não pode ser outra senão a de temor ”Eu, Daniel, era o único a ver essa aparição; meus companheiros não a viram, mas se apoderou deles um tão grande pavor que fugiram para esconder-se. Fiquei portanto sozinho a contemplar essa grandiosa aparição. As forças me abandonaram: a tez do meu rosto tornou-se lívida e eu desfaleci” (Dn 10,7-8).

O temor é o sentimento comum que invade todos os presentes. O evangelista registra este temor quando fala dos soldados, mas as palavras do anjo fazem supor que as mulheres também estavam cheias de temor.

Entretanto, os efeitos do acontecimento são diferentes para os integrantes de ambos os grupos. Os guardas “ficaram como mortos”, reação diferente daquela dos santos que, despertando no momento da morte de Jesus, saíram de seus túmulos “Os sepulcros se abriram e os corpos de muitos justos ressuscitaram. Saindo de suas sepulturas, entraram na Cidade Santa depois da ressurreição de Jesus e apareceram a muitas pessoas” (Mt 27,52-53). Aqueles que quiseram manter morto a Jesus se encontram agora mortos de medo.

Pelo contrário, o temor suscitado pela alegria nas mulheres recebe do anjo uma palavra de consolo e aprovação. A manifestação de Deus no tremor de terra opera um discernimento no ânimo dos que a experimentam. Pode destruir e dar alegria, segundo as disposições interiores de cada um.

Descreve-se, desta forma, um juízo para cada homem ou mulher que se enfrenta com este acontecimento decisivo da história humana, no qual Deus, em Jesus, triunfou sobre o poder da morte.

Este discernimento confere às mulheres um encargo que elas devem cumprir. Sua exata percepção feminina dos acontecimentos, percepção presente em todo o relato da Paixão-Ressurreição (mulher de Betânia, esposa de Pilatos, mulheres da Galiléia no Calvário e no sepulcro) as torna mais sensíveis à compreensão do acontecimento pascal.

Por isso recebem do anjo a aprovação e o anúncio que torna plena a sua intuição: “Sei que procurais Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui! Ressuscitou como havia dito!” Junto a isso recebem uma missão: devem transmitir uma palavra aos discípulos. Elas foram testemunhas de que a pedra do sepulcro havia sido retirada e devem contar este fato aos discípulos. Postas em movimento, devem, com essa palavra de vida, imprimir movimento aos discípulos.

A referência sobre a Galiléia dada por Jesus a seus discípulos na História da Paixão (Mt 26,32) é agora confirmada pelo anjo. Cumpre-se plenamente para toda a comunidade eclesial a promessa feita em Isaías e inaugurada pela atividade pública de Jesus: na “Galiléia dos pagãos, o povo que habitava nas trevas viu uma grande luz; para os que habitavam em terra e sombra de morte brilhou uma luz” (Mt 4,15-16; Is 8,23-9,1).

Exatamente nessa terra, paradigma da morte e das trevas causadas pela exploração e opressão dos poderes imperiais, é possível desde agora o encontro com Jesus. Ali se poderá contemplar o “Deus conosco” do começo (Mt 1,23) e do final (Mt 28,20) deste evangelho.

À notícia desta irrupção da vida, os integrantes da comunidade cristã reagem com temor e alegria. Sentimentos entrelaçados que lhes ajudam a fazer o anúncio pascal tomando distância do sepulcro e da morte que o rodeia, e correndo para o encontro com o seu Senhor. 


LITURGIA BATISMAL

A noite de Páscoa é o momento no qual tem mais sentido celebrar os sacramentos da iniciação cristã.

Depois de um caminho pelo catecumenato (pessoal, se é que se trata de adultos e da família, para as crianças, e sempre no que diz respeito, da comunidade cristã inteira), o símbolo da água -a imersão, o banho- busca ser a expressão sacramental de como uma pessoa se incorpora a Cristo na sua passagem da morte à vida.

Como diz o Missal, se é que se trata de adultos, esta noite é quando tem pleno sentido que além do Batismo também se celebre a Confirmação, para que o neófito se integre plenamente à comunidade eucarística. O sacerdote que preside nesta noite tem a faculdade de conferir também a Confirmação, para fazer visível a unidade dos sacramentos da iniciação.

Se houver batismo, chamam-se os catecúmenos, que são apresentados pelos padrinhos à Igreja reunida.


LADAINHA DE TODOS OS SANTOS

Nós, Igreja peregrina, em profunda comunhão com a Igreja do céu, reafirmamos nossa fé e pedimos a intercessão daqueles que nos precederam na glória do Cristo ressuscitado. (Por ser tempo pascal, todos ficam em pé). 


BÊNÇÃO DA ÁGUA BATISMAL

Durante a oração o sacerdote mergulha op círio pascal na água uma ou três vezes. Se houver batismo cada catecúmeno renuncia ao demônio, faz a profissão de fé e é batizado.

A bênção da água se trata sobretudo de bendizer a Deus por tudo o que fez por meio da água ao longo da História da Salvação (desde a criação e a passagem pelo Mar Vermelho até o Batismo de Jesus no Jordão), implorando-lhe que hoje também este sinal atualize o Espírito de vida sobre os batizados; se não se realizou a celebração do Batismo, (do contrário já a realizaram junto com os batizados e seus padrinhos).

Trata-se de que todos participem conscientemente tanto na renúncia como na profissão de fé; o sinal da aspersão, com um canto batismal, como recordação do próprio Batismo.

Este sinal pode se repetir todos os domingos do Tempo Pascoal, ao início da Eucaristia; a Oração universal ou oração dos fiéis, que é o exercício, por parte da comunidade, do seu sacerdócio batismal intercedendo perante Deus por toda a Humanidade. 


RENOVAÇÃO DAS PROMESSAS BATISMAIS

Após o rito do batismo (se houver) ou da bênção da água, todos em pé e com as velas acesas, renovam as promessas do batismo.

Terminada a renovação das promessas do batismo, o sacerdote asperge o povo com a água benta, enquanto todos cantam.

Em seguida o sacerdote volta à cadeira, onde, omitindo o creio, preside a oração dos fiéis. 


LITURGIA EUCARÍSTICA

A celebração Eucarística é o ápice da Noite Pascoal. É a Eucaristia central de todo o ano, mais importante que a do Natal ou da Quinta-feira Santa. Cristo, o Senhor Ressuscitado, nos faz participar do seu Corpo e do seu sangue, como memorial da sua Páscoa. É o ponto mais importante da celebração.

Como viver esse dia?
Quem participou, nos dias anteriores, da paixão e morte do Senhor poderá, facilmente, penetrar no espírito desse grande dia.

Jesus foi como o grão de trigo depositado no sepulcro. Porém, o gérmen da vida da ressurreição está para eclodir na maior das vitórias.

Enquanto nos preparamos para a solene e alegre vigília desta noite pascal, alimentamos nossa esperança, lembrando-nos dos fatos e momentos em que o amor de Deus se tornou mais presente em nossa vida pessoal, na vida de nossa família, na comunidade. A lembrança do que Deus fez por nós reanima a certeza de que com ele venceremos definitivamente toda divisão, toda expressão de morte que ainda houver entre nós.

Nas famílias em que se costuma fazer oração comunitária, nos grupos ou movimentos e na comunidade, poder-se-ia organizar um encontro comunitário para descobrir as sementes de vida e de esperança que existem em nossa realidade e dar graças ao Senhor, pois sua vitória já é uma realidade.

A vigília pascal dessa noite é o momento – ápice e ponto central de toda Semana Santa. Participar dessa cerimônia significa encontrar o sentido pleno de tudo o que vivemos; é ressuscitar com Cristo, participar de seu triunfo sobre a morte e o mal, renascendo para uma vida nova. Por meio da luz do ressuscitado que receberemos essa noite, conseguiremos iluminar nossas famílias, o ambiente de trabalho tantas coisas obscuras que existem na sociedade atual.

Muitos cristãos costumam, nesse dia, reunir-se para rezar o santo rosário e preparar-se, em companhia de Maria, para a vigília pascal.


DOMINGO DE PÁSCOA: A FESTA DA VITÓRIA DE JESUS

A ressurreição é uma verdade fundamental do cristianismo. Cristo verdadeiramente ressuscitou pelo poder de Deus.

Não se trata de um fantasma, e nem de uma mera força de energia, nem de um corpo revivido como o de Lázaro que voltou a morrer.

A presença de Jesus ressuscitado não é uma alucinação dos Apóstolos. Quando dizemos “Cristo vive” não estamos usando um modo de falar, como pensam alguns, para dizer que vive somente em nossa lembrança.

A paixão, morte e ressurreição de Cristo são fatos históricos que sacudiram o mundo de sua época e transformaram a história de todos os séculos.

Cristo vive para sempre com o mesmo corpo com que morreu, mas este corpo foi transformado e glorificado (1Cor 15,35-45) de maneira que goza de uma nova ordem de vida como jamais viveu um ser humano. A vida de Cristo a vivemos através da graça. Os que são de Cristo já participam desta vida nova de Cristo desde o batismo. Esta vida ativa em nós se chama graça.

Pode ser perdida pelo pecado mortal, mas pode ser recuperada pelo perdão sacramental, e devemos aumentá-la vivendo fielmente a nossa fé. A graça nos dá fortaleza, esperança e a capacidade de um amor sobrenatural. Nos torna capazes de compreender o sentido profundo da vida e das lutas porque nos comunica a perspectiva de Deus.

O cristão, movido pelo Espírito Santo vive em graça de Deus, se preparando para a continuação de sua vida eterna após a morte. Esta vida de Cristo foi vivida pelos santos (Rm 6,8) de maneira exemplar. Todos deveram segui-los para sermos também santos. Sem a graça, os homens caem em um grande vazio, em uma vida sem sentido.

A morte, tanto espiritual quanto física, é a conseqüência do pecado que entrou no mundo pela rebeldia de nossos primeiros pais. Estamos sujeitos à morte física, mas o “aguilhão” do pecado foi substituído pela esperança certa na ressurreição. Jesus Cristo pagou o preço por nossos pecados com sua morte na cruz. Venceu assim todos os seus inimigos.

O último inimigo a ser destruído, no final dos tempos, será a morte. Por isso, a morte não é o final, tampouco encerra um ciclo como pensam os propositores da reencarnação. Vivemos e morremos uma só vez.

Durante nossa vida mortal decidimos nossa eternidade. Recebemos a graça e a misericórdia de Deus que nos abre as portas do céu. Ao final dos tempos será estabelecido plenamente o reino do Senhor.

Todos ressuscitaremos

Cristo ressuscitado é o primeiro fruto (1Cor 15,20) da nova criação. Com sua cruz, Ele abriu as portas para que nossos corpos também ressuscitem. Por isso nós, cristãos, não somente cremos na ressurreição de Jesus como também na “ressurreição da carne”, como professamos no credo dos Apóstolos, quer dizer na ressurreição de todos os homens.

São Paulo escreve sobre isto: “Com efeito, se por um homem veio a morte, por um homem vem a ressurreição dos mortos. Assim como em Adão todos morrem, assim em Cristo todos reviverão” (1 Cor 15,21-22) e mais adiante: “Num momento, num abrir e fechar de olhos, ao som da última trombeta (porque a trombeta soará). Os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados” (1Cor 15,52).

O Ressuscitado é o Crucificado

Costuma-se dizer em teologia que a ressurreição de Jesus não é um fato “histórico”, o que não significa tratar-se de algo irreal, mas de uma realidade que transcende ao físico.

A ressurreição de Jesus não é um fato realmente registrável na história; ninguém conseguiria, por exemplo, fotografar aquela ressurreição.

A ressurreição de Jesus, objeto de nossa fé, é mais que um fenômeno físico. De fato, os evangelhos não nos narram a ressurreição, porque ninguém a viu.

Os testemunhos que nos deixaram são experiências de crentes que, depois da morte de Jesus, “sentem vivo” o ressuscitado; não são testemunhas do fato mesmo da ressurreição.

A ressurreição de Jesus não se parece em nada com um “reviver” (a filha de Jairo). A de Jesus não consistiu numa volta a esta vida, nem na reanimação de um cadáver (de fato, teoricamente, não causaria espanto crer na ressurreição de Jesus mesmo que seu cadáver tivesse ficado entre nós, porque o corpo ressuscitado é bem diferente do corpo de um cadáver).

A ressurreição (tanto a de Jesus como a nossa) não é uma volta atrás, mas um passo à frente, um passo para a outra vida, a de Deus. Importa recalcar este aspecto para cairmos na conta de que nossa fé na ressurreição não é a adesão a um “mito”, como ocorre em tantas religiões que têm mitos de ressurreição.

Nossa afirmação da ressurreição não tem por objeto um fato físico, mas uma verdade de fé com sentido muito profundo, que queremos agora destrinchar.

A “boa notícia” da ressurreição foi conflitiva

Uma primeira leitura dos Atos dos Apóstolos suscita uma certa estranheza: por que a notícia da ressurreição suscitou a ira e a perseguição dos judeus? Notícias de ressurreições eram, naquele mundo religioso, mais freqüentes e menos estranhas que entre nós. Ninguém ficaria ofendido, em princípio, com a notícia de alguém tivesse tido a sorte de ser ressuscitado por Deus.

Entretanto, a ressurreição de Jesus foi recebida com uma agressividade extrema pelas autoridades judaicas. O contraste com a situação atual nos faz pensar: atualmente ninguém mais se irrita ao ouvir tal notícia.

O anúncio pascal da ressurreição de Jesus pode agora suscitar indiferença. Por que então essa diferença de atitudes? Será que anunciamos a mesma ressurreição ou, no anúncio da ressurreição estamos anunciando outra coisa diferente?

Lendo mais atentamente os Atos dos Apóstolos já nos damos conta de que o anúncio feito pelos apóstolos tinha já em si mesmo um ar polêmico: anunciavam a ressurreição “desse Jesus que vocês crucificaram”; ou seja, não anunciavam a ressurreição de maneira abstrata, como se a ressurreição de Jesus fosse simplesmente a afirmação do prolongamento da vida após a morte.

Tampouco estavam anunciando a ressurreição de uma pessoa qualquer, de qualquer ser humano que teria transpassado as fronteiras da morte.

O crucificado é o ressuscitado

Os apóstolos anunciavam uma ressurreição bem concreta: a daquele homem chamado Jesus, a quem as autoridades civis e religiosas desprezaram, excomungaram e condenaram.

Quando Jesus foi atacado pelas autoridades, encontrou-se sozinho. Seus discípulos o abandonaram, e até mesmo o próprio Deus guardou silêncio, como se o tivesse também abandonado. Com sua morte de cruz, tudo parecer concluir. Seus discípulos se dispersaram e quiseram esquecer tudo.

Mas aí aconteceu algo de novo. Uma experiência nova e poderosa se lhes impôs: sentiram que Jesus estava vivo. Invadiu-lhes uma estranha certeza: Que Deus havia tomado as dores de Jesus e agora se empenhava por reivindicar seu nome e sua honra. “Jesus está vivo”, a morte não pode vencê-lo.

Deus o ressuscitou e o fez assentar-se à sua direita, confirmando a veracidade e o valor de sua vida, de sua palavra, de sua Causa. Jesus tinha razão e sem razão ficaram os que o expulsaram deste mundo.

Deus está do lado de Jesus; Deus respalda a Causa do Crucificado. O Crucificado ressuscitou, está vivo!

Foi exatamente isto que irritou as autoridades judaicas: Jesus lhes irritou quando ele estava vivo e lhes irritou ainda mais quando ressuscitou entre seus discípulos. Não era tanto o fato físico da ressurreição que irritava as autoridades, que um ser humano estivesse vivo ou morto; o que não podiam tolerar era que aquele ser humano concreto, Jesus de Nazaré, cuja Causa (seu projeto, sua utopia, sua boa notícia) consideravam tão perigosa e que já a supunham descartada com a crucifixão, se pusesse novamente de pé, ressuscitado.

Não podiam aceitar que Deus estivesse defendendo aquele crucificado que fora condenado e excomungado. Era impossível para eles que Deus se manifestasse a favor de Jesus, que lhe desse seu aval. Eles acreditavam em outro Deus, não naquele que os discípulos de Jesus acreditavam e experimentavam em Jesus ressuscitado.

Crer com a fé de Jesus

Entretanto, os discípulos que redescobriram em Jesus o rosto de Deus (o Deus de Jesus), compreenderam que ele era o Filho, o Senhor, a Verdade, o Caminho, a Vida, o Alfa e o Ômega. A morte já não tinha nenhum poder sobre ele. Estava vivo. Havia ressuscitado. E não podiam senão confessá-lo e “segui-lo”, “perseguindo sua Causa”, obedecendo a Deus antes que os homens, mesmo que isto lhes custasse a morte.

Crer na ressurreição não era, pois, para eles, tanto a afirmação de um fato físico-histórico, nem uma verdade teórica abstrata (a vida pós-mortal), mas a afirmação contundente da validez suprema da Causa de Jesus (o Reino de Deus!), à altura mesma de Deus (“à direita do Pai”, como valor absoluto), pela qual é necessário viver e lutar “até dar a vida”.

Crer na ressurreição de Jesus é, sobretudo, crer que sua palavra, seu projeto e sua Causa (o Reino!) expressam o valor fundamental de nossa vida. E se nossa fé reproduz realmente a fé de Jesus (sua visão da vida, sua opção frente à história, sua atitude perante os pobres e também perante os poderosos…) será tão conflitiva como foi a pregação dos apóstolos ou a vida mesma do nazareno.

Em troca, se a ressurreição de Jesus for reduzida a um símbolo universal de vida pós-mortal (como poderia ser no universo comum das religiões), ou à simples afirmação da vida sobre a morte, ou a um fato físico-histórico que aconteceu vinte séculos atrás… então essa ressurreição fica vazia do conteúdo que teve em Jesus e já não tem mais nada a dizer a alguém, nem irritará os poderosos deste mundo ou até poderá desviar o caminho da Causa de Jesus.

O importante é crer como Jesus; ter a fé de Jesus: sua mesma atitude frente à história, sua Causa, sua opção pelos pobres, sua proposta, sua luta decidida…

Crendo com essa fé de Jesus, as “coisas do alto” e as da terra não são mais duas direções opostas, nem mesmo diferentes. As “coisas do alto” são a Terra Nova que está enxertada aqui em baixo. Devemos fazê-la nascer no doloroso parto da História, sabendo que nunca será o fruto adequado de nosso planejamento, mas dom gratuito daquele que vem. Buscar “as coisas do alto” não significa ficar esperando passivamente que chegue a hora escatológica (que já soou na ressurreição de Jesus), mas tornar realidade em nosso mundo o Reino do Ressuscitado: Reino de Vida, de Justiça, de Amor e de Paz.

Como será o corpo ressuscitado?

Ninguém neste mundo pode compreender completamente mas sabemos que será como o corpo ressuscitado de Cristo. Similar em alguns aspectos a nosso corpo em sua forma atual, mas, para os redimidos, um corpo transformado e glorificado. Jesus Cristo ressuscitado já não morre, já não sofre as limitações do corpo mortal, as paredes e as portas fechadas já não são obstáculos para Ele. “Caríssimos, desde já somos filhos de Deus, mas o que nós seremos ainda não se manifestou. Sabemos que por ocasião desta manifestação, seremos semelhantes a ele, porque o veremos tal como ele é “(1Jo 3,2). 

Como viver o domingo da ressurreição?

O Senhor ressuscitou Aleluia! Alegremo-nos e regozijemo-nos nele. Sim, alegremo-nos e contagiemos o mundo de esperança e de alegria. Se Cristo não tivesse ressuscitado, então nossa fé e nossas esperanças não teriam sentido. Mas a última palavra sobre nossa vida não é a morte, a dor, mas sim a vida, a vitória.

As mulheres foram as primeiras testemunhas da ressurreição e elas a anunciaram aos discípulos. Entretanto, somente encontraram o Senhor, viram-no vivo, junto com a comunidade, em companhia dos outros irmãos

Eis nosso compromisso: ser testemunhas da ressurreição, demonstrar com nosso exemplo de vida que Cristo está vivo e continua amando e servindo através de nós.

A comunidade é o lugar privilegiado da presença de Senhor, pois a participação, a solidariedade e o compartilhar fraterno é uma das mais claras manifestações de que ressuscitamos com ele. Participando da vida do Ressuscitado, poderemos agora empreender um caminho novo que se exprimirá, sobretudo em nossa forma de relacionamento com Deus e com os outros.

O capítulo quinto do evangelho de São Mateus, bem como o capítulo sexto do evangelho segundo São Lucas, poderá ajudar-nos a fazer frutificar essa vida nova que tomou conta dos nossos corações. Os relatos das aparições de Jesus ressuscitado aos discípulos e a mudança que neles se operou são o testemunho vivo do que deveria acontecer também conosco, se deixássemos tomar conta de nossas vidas.

Todo o tempo pascal que começa hoje e que culmina com a festividade de Pentecostes tem esta finalidade: conduzir-nos a um processo de ressurreição e de vida nova. Que nossa transformação pessoal desperte e promova a vida, contribuindo para o crescimento do reino de Deus em nossa sociedade. È essa a tarefa recebida por nós, na Semana Santa. 

Fontes de consulta 
Bíblia – Ave Maria e CNBB
Como viver a Semana Santa – Editora Ave-Maria
Quaresma, Páscoa e Pentecostes – Pe José Bortolini
Preparando a Páscoa – Ione Buyst
Semana Santa – Pe Luiz Miguel Duarte
Missal Romano
Compêndio do Vaticano II